Dois fatos desconectados, de incrível coincidência, na Espanha e na França, uniram o interior de Santa Catarina e o de São Paulo por uma idiossincrasia do mercado internacional.


Em outubro, o World Cheese Awards – “Oscar dos Queijos” – realizado em Oviedo (Espanha), reconheceu com o selo dourado o pomerodense Vale do Testo. O resultado poderia ter sido melhor, não fosse por um incidente: os queijos brasileiros chegaram atrasados e não puderam disputar em igualdade com os quase quatro mil avaliados. Passaram então por um julgamento em caráter excepcional e conquistaram 14 medalhas. Do interior paulista, quatro representantes levaram o bronze: Tulha e Caprinus, de Amparo, Dolce Bosco e Serra do Lopo, de Joanópolis.


O atraso dos brasileiros se deve à burocracia. Como não temos acordo com a União Europeia para exportação de produtos lácteos, fica difícil a participação dos queijos nos concursos. As amostras foram barradas ao chegar na Espanha.
O irônico é que, em setembro, na França, o Brasil havia ficado em segundo lugar na “Copa do Mundo” do queijo, sendo que o paulista Pardinho Especial (de Pardinho) e alguns mineiros levaram medalhas de ‘super ouro’.


Em 18 de novembro, tendo o queijo como um dos símbolos, o governador João Doria sancionou a Lei dos Produtos Artesanais de Origem Animal do estado de São Paulo. Instituiu um grupo de trabalho para regulamentar a nova lei, para desburocratizar a produção e a comercialização de queijos e demais produtos artesanais em todo o estado.


O objetivo é estimular o crescimento do setor. Doria ainda anunciou o projeto “Produtos Artesanais e Tradicionais do Agro de São Paulo”, para fomento, valorização e apoio à produção agropecuária artesanal, especialmente aqueles processados por pequenas e médias agroindústrias artesanais, de origem animal e vegetal. Vai valorizar as características culturais e regionais dos produtos que fazem parte do patrimônio histórico e cultural de São Paulo, de forma a também reforçar a importância turística e econômica.


A lei traz novas normas para comercialização e produção artesanal alimentícia, como os queijos, linguiças, pães e bolos. A anterior não atendia às necessidades do pequeno produtor e da agroindústria de pequeno porte. Os estudos foram realizados pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento.


Serão beneficiados produtores de pequeno porte de diversas cadeias produtivas incluindo mel, derivados de cana, cachaça, peixe salgado seco, processados de pequenos animais, cafés especiais, entre outros.
A lei prevê a criação de uma equipe especializada no Serviço de Inspeção de São Paulo (SISP) para padronizar tecnicamente a produção artesanal.


O reconhecimento dos sabores locais, aliado ao respeito e à certificação das normas sanitárias de produção, garantirão a qualidade aos consumidores e, com o tempo, deixarão no folclore aquela situação constrangedora, quando os produtores brasileiros levavam seus queijos em malas, de forma clandestina, para participar dos concursos internacionais.

Santa Catarina tem fama mundial e nacional quando se trata de produção de sabores locais. Florianópolis, por exemplo, é Cidade Criativa Unesco da Gastronomia desde 2014. Lembro também que fui um dos idealizadores e fundadores da Escola de Gastronomia da Unisul, no acesso à Ponte Pedro Ivo Campos, na Capital – iniciativa que depois de algum tempo infelizmente acabou subaproveitada. Enfim, esse segmento tem que ser cada vez mais incentivado – e protegido – porque se trata não apenas de um mercado, trata-se de famílias, de pequenos produtores, de geração de emprego e renda, de gente que conserva um dos mais belos aspectos das nossas etnias e toda nossa tradição.

No “plano de vida” que estamos desenhando para o futuro de SC, sem dúvida nossa gastronomia local – comida da terra e do mar, vinhos, cervejas, cachaças, doces e tantas “atrações” – terá lugar de destaque na mesa do planejamento e da gestão.