A Polícia Civil, por meio da Diretoria Estadual de Investigações Criminais (Deic), realizou uma operação na Prefeitura de Florianópolis na sexta-feira. Como alvo, Felipe Pereira, ex-chefe de fiscalização da Fundação Municipal do Meio Ambiente (Floram), que foi objeto de mandado de busca e apreensão no ano passado e, por isso, foi removido do cargo ainda em 2022, quando assumiu outra função no mesmo setor como servidor efetivo.

Pereira foi flagrado recebendo propina de um construtor para desembargar uma obra que seria irregular no Sul da ilha. Ele foi filmado recebendo cerca de R$ 50 mil que seria uma primeira parcela, de uma quantia que chegaria a R$ 105 mil. Ainda na sexta-feira, foi cumprido um mandado de busca e apreensão no setor onde Felipe trabalhava.

Segundo as investigações, a obra supostamente irregular está localizada no Ribeirão da Ilha e pertence a um construtor com histórico de irregularidades em obras, que, inclusive, já teve que pagar multa e demolir algumas construções. Esse mesmo construtor teria procurado a PC se oferecendo para colaborar com as investigações.

Além de Felipe Pereira, também foram citados por construtores os servidores Nei João da Silva, que deixou a prefeitura no início do ano para o Detran, Carlos Augusto de Jesus e Fernando Berthier da Silva como os responsáveis pelo esquema. Na mesma sexta-feira, todos os citados foram exonerados.

Depoimento

Em seu depoimento, Maurício Sullyman Miller Rodrigues, na condição de testemunha, relata que construiu empreendimentos na região do Sul da ilha e que dois fiscais da prefeitura o abordaram para exigir propina, no valor entre R$ 15 mil e R$ 20 mil por apartamento. Os valores em questão deveriam ser pagos na sede da SMDU sob os cuidados do chefe de Fiscalização, Nei João, ou do assessor jurídico Fernando Berthier da Silva. “Quando constatada irregularidade, a SMDU emite intimação para dar ciência de multa ou ordem de embargo. Abre-se, então, um prazo para que o construtor busque o órgão para providências. Nesta oportunidade, o construtor é cooptado para ‘resolver o problema’ mediante o pagamento de propina”, disse Rodrigues em seu depoimento.

Já o construtor Arlan Nunes Quell, que aparece pagando a propina, relatou que atua no ramo há alguns anos e que sempre teve dificuldade em obter licenças para suas obras. Ele admitiu que há algum tempo tem pago propina e que, mesmo com a troca de servidores, o esquema continua.

Em parte do relato, volta a surgir o nome de “Fernando”, assessor jurídico da SMDU. Segundo o construtor, Fernando e Nei tiveram participação ativa na demolição de uma obra sua, motivo pelo qual, segundo o empresário, seria o não pagamento de propina. Acontece que a mesma obra foi demolida em duas ocasiões.

Quanto a Felipe Pereira, preso na sexta-feira, Quell disse aos policiais que já teria dado a ele cerca de R$ 450 mil em dinheiro. Uma das entregas ele filmou o servidor. Assista:

Os pagamentos a Pereira, segundo o empresário, foram feitos na conta de Daiana Roselete Pereira, esposa do servidor. Em um telefone ao qual os policiais tiveram acesso, foram encontrados diversos comprovantes de transferência bancária de Edinaldo Santos da Conceição, funcionário que teria ficado com a responsabilidade de sacar o valor e repassá-lo a Felipe Pereira.

Outra forma de pagamento foi por meio de uma transação cruzada. Arlan Quell transferiu para Vanessa Gauer o montante de R$ 49.999. Ela efetuou o saque e entregou o dinheiro em mãos a ele. Esses valores foram retirados da conta pertencente a Leonice Teresinha Brambilla, cunhada e vizinha do empresário. Já Vanessa e seu marido seriam amigos da família, conforme o relato do construtor. As duas mulheres citadas, não aparecem no inquérito como participantes do esquema que ainda está sendo investigado. Também foi apresentada aos policiais uma série de diálogos via WhatsApp, onde, ao cobrar a propina, Felipe Pereira se refere ao dinheiro como “documento”. Tentei o contato de alguém ligado aos citados, mas ainda não consegui.

Topázio se manifesta

O prefeito de Florianópolis, Topázio Neto (PSD), se manifestou através de um vídeo nas redes sociais. Ele afirmou achar estranho que um vídeo de um ano atrás não tenha motivado um alerta para a prefeitura, a fim de que pudesse afastar o servidor. O questionamento é devido a um convênio firmado entre o município e a Polícia Civil, que criou um núcleo de anticorrupção assinado no final do ano passado. O núcleo é responsável por verificar processos e atuar preventivamente, além de garantir que investigações sejam realizadas nos casos suspeitos de corrupção.

Empresário

A polícia deixa claro no inquérito que a conduta do construtor será apurada no decorrer das investigações. Arlan Nunes Quell tem um histórico de irregularidades em obras, além de ter admitido o pagamento de propina.

Vazamento seletivo?

Há uma suspeita de que houve um vazamento seletivo da Polícia Civil para um canal de televisão com abrangência nacional. As suspeitas se devem ao fato de que a equipe dessa emissora chegou a Florianópolis um dia antes da operação, tendo vindo ao estado especialmente para fazer uma reportagem sobre esse caso, que será tema de matéria em um dos programas mais assistidos do país.