A Casa de meu pai e as peças do destino – Coluna do Vinícius Lummertz
Há alguns dias a imprensa catarinense destacou – e o trade turístico comemorou – quarta posição no ranking Traveller’s Choice dos melhores hotéis de luxo do Brasil e da América do Sul para o Vila do Valle, de Blumenau. Realmente é um lugar lindo, aconchegante, com serviço impecável, um ambiente singular e até ‘espiritual’ – mas eu sou suspeito para falar disso, como vocês vão ver a seguir. É que o casarão onde hoje se localiza o Villa do Vale, nos altos da Rua Petrópolis, era a casa do meu pai, a casa da família Lummertz Silva, onde vivi momentos inesquecíveis entre a infância e a juventude.
Naqueles momentos não poderia imaginar que um dia eu seria Ministro do Turismo do Brasil e que aquela casa viria ser um ícone para nossa indústria turística. Estive lá no hotel duas vezes. A primeira delas nos últimos dias frente ao Ministério, em 2018, a convite do casal proprietário, Diego e Juliana Tulio, e do prefeito Mário Hildebrandt. A segunda foi no ano passado, acompanhado da minha esposa, Simone. Em ambas, a emoção tomou conta, o álbum de família desfilou sob meus olhos e o meu coração.
Para tentar dividir esse momento tão especial com vocês, vou reproduzir aqui o artigo que escrevi para alguns jornais da imprensa catarinense em agosto de 2018 – quando o hotel não havia ainda sido inaugurado. Se chama “A Casa de meu pai”:
“O destino tem seus caprichos: no momento em que sou Ministro de Estado do Turismo a casa aonde fui criado e vivi desde os três anos de idade, em Blumenau, e aonde meus pais viveram até os meus 27 anos, vai se transformar num esperado Hotel de Charme.
Minha casa ficava no alto da Rua Petrópolis, numa longa continuação da Amadeu da Luz, subindo o morro em curvas serpenteantes até o topo, quando a estrada circunda a casa e chega num largo anterior. É natural que a novidade me confunda e me comova, pois me fará viajar ao passado mais remoto nas vestes atuais.
Ao lembrar revivo, no grande jardim, a vista da cidade lá de cima, de frente da casa, das muitas flores – todas que possa imaginar. Além das plantas, as árvores frutíferas plantadas pelo Otte, primeiro proprietário, um alemão que deve ter pensado no Eden ali mesmo. Vivi com meus irmãos, Elaine e Savio, entre goiabas, araçás das três cores, ameixas, tangerinas, laranjais, parreiras de uva, pés de caqui, pera e maçã. É verdade que as peras eram fraquinhas, mas os dois pés de caju surpreendiam todos os anos. E por tantas frutas, uma algaravia de pássaros de todas as cores.
Também foram tempos de muita movimentação por lá. Nos fundos da casa havia um depósito e os escritórios do comércio de atacado de meu pai, Laércio Lauro Silva, em cuja enorme garagem foi organizada uma festa psicodélica – as pinturas coloridas ficaram anos nas paredes. Do segundo andar, minha mãe, Jane Lummertz, comandava a moda na região na primeira boutique do estado, com grandes desfiles nos clubes e nos jardins da própria casa.
Eram modelos famosas na época, Márcia de Windsor, Marisa Urban – e mesmo Vera Fischer foi vestida pela tal boutique. Eram anos de um grande glamour que tinham
no colunista Carlos Mueller seu porta-voz com bailes e festas.
Tinha vizinhos queridos. Os Schultz, da loja de calçados Marva – entre eles, o Sigmar, ao lado de quem conquistamos um inédito título estadual de futebol de salão pelo Colégio Santo Antônio. E a família Souza, do seu Orlando e da Dona Rosa, ele marceneiro do Santo Antônio, que tinha uma lambreta verde e tantos filhos com a Dona Rosa quanto o Seu Duda com a Dona Lina, os Dudalina.
O Hotel é esperado para breve, me contou em Brasília o prefeito Mário Hildebrandt. É uma iniciativa da Juliana, filha do meu contemporâneo, Anselmo Hess de Souza, ela é da terceira geração dos empreendedores dos Dudalina. Vou fazer uma reserva, na esperança de que por uma noite volte a dormir no meu velho quarto, na infância da qual tenho não apenas lindas memórias, mas que ainda habita muitos dos meus sonhos de idílio de criança e juventude. Tive muitas casas, morei em muitos lugares do mundo, mas aquela continua sendo para mim o símbolo e o sentido de Casa. A Casa de meu pai e do seu Camaro vermelho.
Aos hoteleiros que ali se instalam tenho algo singelo por dizer: que tenham muito sucesso nesse lugar aonde vi muita alegria e felicidade. Que agora seja compartilhada por pessoas de todas as partes, nesse charmoso hotel que nasce – mas que, para mim, será sempre a Casa de meu pai”.
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