No livro “O Mundo é Plano – Uma breve história do século XXI”, Thomas Friedman chamou a atenção para as mudanças causadas pelo avanço tecnológico. A globalização havia chegado aos pequenos negócios, motivada pela conectividade digital, como o excedente de espaço para circulação de dados em milhares de quilômetros de cabos submarinos instalados entre os continentes. O resultado era o achatamento do mundo (não confundir com terraplanismo), com tempo e espaço se confundindo.
A base da transformação estava principalmente nos Estados Unidos e dois gigantes populacionais: Índia e China. Um exemplo adaptado: às 17hs de um dia qualquer, um escritório texano especializado em declaração de imposto de renda digitaliza os documentos de um cliente e envia para um parceiro na indiana Bangalore. Na manhã seguinte o trabalho está feito: usando o fuso horário a seu favor, o americano dormiu enquanto o indiano trabalhou. E todos ganharam.


Impactados pela pandemia, vemos uma derivação desta situação: o aumento dos nômades digitais. Profissionais de diversas áreas que, com o trabalho remoto forçosamente adotado, passaram a exercer suas funções em qualquer lugar onde há, basicamente, uma boa conexão com a internet.
O ‘anywhere office’ é muito poderoso. Se o trabalho migrava, agora quem viaja é o trabalhador. Segundo a Associação Brasileira dos Especialistas em Migração e Mobilidade Internacional, hoje são 35 milhões de nômades digitais no mundo; em 2035 chegará a 1 bilhão.


Em janeiro o governo brasileiro aprovou um visto especial para este público. Tem validade de um ano, renovável, desde que o interessado não esteja ligado a nenhuma empresa nacional e tenha um rendimento mensal mínimo de pelo menos US$ 1,5 mil. Com tal decisão o Brasil junta-se a quase três dezenas de países que, com regras mais ou menos restritivas, querem atrair esses profissionais.
Com infraestrutura de comunicação (internet meia-bomba não dá) podemos atrair profissionais que, no limite, gastarão aqui o que recebem de empresas lá de fora. No “mundo-planismo”, a distância entre o Brasil e os grandes mercados deixa de ser um ponto negativo.


Por este mesmo princípio de “longe-perto”, Florianópolis – e, por consequência, Santa Catarina – tem vantagem competitiva única, quase imbatível. Senão, vejamos: está a uma hora de voo de São Paulo, principal metrópole nacional e hub aéreo sul-americano; Capital de estado com frescor urbano incomparável; grande, porém não sufocante; praias belíssimas e clima convidativo. Vamos acrescentar a essa receita a chegada do 5G e, muito especialmente, o ambiente de cultura tecnológica e empreendedora dos catarinenses.


Ou seja, um berlinense viajar por 12 horas, desembarcar em São Paulo, fazer uma conexão ou algumas horas de estrada, passear e voltar depois de dez dias é bem diferente de um que tenha a possibilidade de ficar dois anos morando, trabalhando e usufruindo de tudo o que Santa Catarina oferece.
Essa via tem mão dupla: empresas brasileiras que aceitem o teletrabalho dos nômades podem atrair talentos – mesmo que fiquem distantes fisicamente. Estudo recente da rede Linkedin informa que houve um aumento não apenas da preferência por parte dos profissionais (principalmente da geração Z) como da oferta de anúncios que têm a flexibilidade como um dos chamarizes: crescimento de 83% nos últimos dois anos.


Essa opção exige cuidado e atenção. Empregado e empregador devem fazer um esforço de assimilação dessa nova mentalidade profissional e cultural, com foco na produtividade. A se confirmarem os números e expectativas, pode ser um novo marco na história do trabalho. No caso da indústria de viagens é um promissor encontro entre as funções profissionais e o turismo de longa de duração – o long stay.
Num Novo Plano para SC, sua economia e seu turismo, o nomadismo digital tem um lugar todo especial. É preciso incentivar os empreendedores catarinenses (coworkings, hotéis/residência, aplicativos de aluguel para moradia, entre outros) ligados a esse novo setor e, é claro, promover Santa Catarina como destino para os nômades digitais ao redor do planeta. Afinal, trabalhar e viver por um bom tempo num dos lugares mais lindos do mundo, agora é um sonho possível.