O “Martelo das Feiticeiras” e o malabarismo suicida da Lava Jato – Coluna do Thiago de Miranda Coutinho
Não é de hoje que a maior operação de combate à corrupção e lavagem de dinheiro do país tem se mostrado um verdadeiro engodo processual que, de forma pirotécnica, promoveu uma espécie de impetuosa “caça às bruxas” dignas de “condenações à morte” em verdadeiras “fogueiras midiáticas”.
Nesse paralelo (recheado de aspas) com a histórica perseguição religiosa e social experienciada no velho mundo nos idos do século XV, tem-se que a Lava Jato possuía um grande potencial para desnudar as entranhas do submundo nocivo que permeava a política brasileira desde os tempos mais remotos.
Todavia, o devido processo não pode ser prescindido ou preterido em face dos “fins que justificam os meios”. Aliás, ele deve ser observado e fielmente regido entre as colunas das leis e do Estado Democrático de Direito.
E é justamente dessa busca pelos fins que o punitivismo aflora entre os meios. Aqui, o chamado jus puniendi (o poder do estado de punir) busca aplicabilidade no extrapolar das regras e de sanções a qualquer custo.
Evidentemente, essa mistura se mostraria infrutífera e desastrosa com o passar dos anos. Afinal, a referida operação – cujo início se deu no ano de 2014 –, foi ganhando capilaridade e se desdobrando em novas fases, mas possivelmente, perdendo a robustez probatória que, no futuro, culminaria em anulações, suspensões e suspeições.
Prova disso foi a recentíssima decisão (02/03/22) do Ministro do STF, Exmo. Sr. Ricardo Lewandowski, que suspendeu cautelarmente a última ação restante contra o ex-presidente Lula no âmbito da Operação Lava Jato.
No ponto, tem-se que nas demais ações, o dito “Estado Inquisidor” também sofreu revés. A ação do triplex no Guarujá, por exemplo, foi arquivada; a do sítio em Atibaia, anulada; e a envolvendo o Instituto Lula, também fora suspensa.
Ora, não se está aqui defendendo (ou celebrando) a impunidade ou a corrupção! Longe disso! Qualquer operador do direito em sã consciência desejaria uma correta aplicação das leis, com respeito às regras processuais e, no caso de eventuais condenações, que fossem justas. São as regras do jogo! Simples! Se houve indícios de crimes, que fossem transformados em provas robustas cuja materialidade e autoria estivessem à prova de qualquer contestação judicial.
Entretanto, o que não se pode comungar em pleno século XXI, é a doutrina adotada no livro “O Martelo das Feiticeiras”, que fora escrito na Alemanha em 1484 e se tornou uma espécie de manual inquisitorial de tortura e morte às “bruxas” (mulheres que se opunham aos credos religiosos da época).
Dessa forma, fazendo uma interseção entre a leitura do livro e da Lava Jato até aqui, vislumbra-se uma perigosa “caça às bruxas” num arriscado e suicida “malabarismo probatório” contra certas figuras públicas que, aos olhos do “inquisidor”, seriam praticantes de “heresias”.
“Malabarismo” como o ocorrido em 2019, quando interpretou-se uma decisão de compartilhamento de provas como sendo um declínio de competência por parte do STF, o que permitiu a continuação de uma investigação envolvendo um “alvo” com foro especial. Manobra descoberta tempos depois e carregada de constrangimentos.
Por fim, talvez pelo ardente desejo em protagonizar um grande show, o exímio malabarista deixa – por imprudência ou imperícia –, o objeto lançado ao ar cair sobre si.
Resta agora saber, portanto, se tal objeto seria o martelo das feiticeiras e se causaria o fim do espetáculo, ou seja, o suicídio da Lava Jato.
KRAEMER, Heinrich; SPRENGER, James. O martelo das feiticeiras, malleus maleficarum, escrito em 1484 pelos inquisidores. Tradução de Paulo Fróes. 28. ed. Rio de Janeiro: Record, 2017.
Thiago de Miranda Coutinho é Jornalista e Pós-graduado em Inteligência Criminal. Atualmente, é Agente de Polícia Civil em Santa Catarina, graduando em Direito pela Univali, Coautor de 3 livros e autor de diversos artigos publicados em canais jurídicos reconhecidos nacionalmente. Instagram: @miranda.coutinho_
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