Próximo de completar 200 anos no Brasil, perpassando do Império à República, o instituto do Tribunal do Júri sempre envolveu certa “mística” e, talvez por isso, aguce tanta curiosidade, interesse e – aos, assim como eu, acadêmicos de Direito –, horas de estudo.

Talvez, dado o intento de compartilhar a administração da justiça com o povo, o também chamado “Júri Popular” é tido como a forma mais democrática de atingi-la.

Por isso, os julgadores são cidadãos comuns; muitas vezes sem qualquer conhecimento jurídico para avaliar e decidir sobre crimes graves.

Notadamente, esculpido no artigo 5º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal, ao Tribunal do Júri é assegurado o sigilo das votações (os votos dos jurados são secretos); a plenitude de defesa (onde todos os meios de defesa poderão ser utilizados, inclusive argumentos não jurídicos); a soberania dos veredictos (em que ao voto dos jurados é garantido o efetivo poder de decisão); e a competência para o julgamento dos crimes dolosos (aqueles em que o autor desejou ou assumiu o risco do resultado) contra a vida;  sejam os crimes que se consumaram ou os que se interromperam na tentativa.

Desta feita, através da condução de um Juiz togado (de carreira), o conselho de sentença (formado por sete jurados cidadãos do povo) julga os seguintes crimes: 

  1. Homicídio (matar alguém);
  2. Infanticídio (matar, sob a influência do estado puerperal – que são intensas alterações psíquicas e físicas em que a mãe deixa de ter plenas condições de entender os fatos praticados –, o próprio filho, durante o parto ou logo após);
  3. Aborto (provocar a interrupção de uma gravidez);
  4. Induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio (tanto punível a quem sugere a ideia para alguém se matar, como quem concorda e incentiva tal atitude manifesta ou, ainda, quem presta qualquer tipo de auxílio à prática).

Conforme Tourinho Filho, em seu Manual de Processo Penal, “esse é um dos traços marcantes no tribunal do júri, pois as funções são divididas entre o juiz togado e os jurados. Assim, cabe exclusivamente aos jurados decidir sobre a materialidade e autoria, causas excludentes de ilicitude, de culpabilidade e de aumento ou diminuição de pena, ao passo que ao juiz presidente, ou seja, ao magistrado, cabe dosar a pena, prolatar a sentença, não podendo afastar-se do decidido pelos jurados”.

Não à toa, este enigmático e peculiar instrumento do Direito também desperte aos operadores jurídicos (tanto Advogados, como Promotores de justiça), indecifráveis desejos de nele atuar.

Mas afinal, o que um Júri Popular tem a nos ensinar?

Na última quinta-feira, dia 18/11, a Universidade do Vale do Itajaí (Univali), promoveu no campus de São José, um Tribunal do Júri simulado, onde diversos estudantes do curso de Direito puderam experienciar todas as nuances – práticas e teóricas –, que permeiam o singular “tribunal das lágrimas”.

Neste brilhante e único experimento acadêmico, tive a honra de integrar a Defesa de um caso complexo em que era imputado a um morador de rua, o grave crime de homicídio triplamente qualificado.

Assim, respondendo à pergunta acima, os ensinamentos de um júri são como rios que margeiam temas sociais, antropológicos, políticos, humanitários, humanísticos, religiosos (e por que não artísticos) que, através de seus tortuosos caminhos, desembocam no mar do Direito.

E quanto ao resultado do aclamado evento promovido pela universidade, mesmo a defesa tendo a tese de desclassificação (para o crime lesão corporal seguida de morte) acolhida pelos jurados… não houve vitória. Afinal, no palco da tragédia humana, todos perdem.