Na coluna de semana passada, em comemoração ao Dia Mundial das Micro, Pequenas e Médias Empresas, fizemos um breve retrospecto da verdadeira saga que foi a criação dessa dimensão econômica que hoje gera 30% do PIB nacional. Na coluna desta semana vamos mostrar que essa luta está infelizmente longe de terminar, inclusive em SC, um estado que é referência no país e no exterior. Um estado de sucesso, que tem um modelo econômico bem-sucedido e um modelo social avançado. Mas não podemos nos acomodar com as conquistas do passado.   

Digo isso porque o Banco Mundial divulgou o “Doing Business Subnacional Brasil 2021”, o primeiro estudo sobre o ambiente de negócios com foco nos 26 estados e no Distrito Federal. Revelou diferenças e criou um ranking com base em cinco grupos de informações: abertura de empresas (tempo, custos e caminho para empreender), obtenção de alvará de construção (novamente tempo, custo e procedimentos), registro de propriedades (para que se possa adquirir uma empresa ou transferir sua titularidade), pagamento de impostos (não apenas valores ou percentuais, mas o tempo despendido no processo) e execução dos contratos (tempo e custos necessários em um litígio comercial).  

Confesso que fiquei muito surpreso: Santa Catarina, 53,2 pontos no ranking geral (na escala de zero a 100), tem muito trabalho a fazer. Está na 20ª posição em 27. Das cinco modalidades avaliadas, ficou em quarto lugar em duas: “abertura de empresas” e “registro de propriedade”. Em “pagamento de impostos” ficou em 13º, em “obtenção de alvará de construção” está em 18º, e em “execução de contratos” teve o pior resultado, em 26º lugar, à frente apenas do Espírito Santo. 

São Paulo ficou em primeiro no ranking geral, com 59,1 pontos, e no item específico “registro de propriedades”, com 65,8 pontos. Em último lugar ficou Pernambuco, com 51 no computo geral. Mas o Pará, por exemplo, ficou em 1º no item “abertura de empresas”, com 84,1 pontos; Roraima liderou em “alvará de construção”, com 63,7 pontos; o Espírito Santo em “pagamento de impostos”, 34,9, e Sergipe em “execução de contratos”, 69,7. Ou seja, no nosso Brasil, o ideal é abrir empresas em Belém, pedir as autorizações de construção em Boa Vista, transferir a titularidade na capital paulista, pagar os impostos em Vitória e apelar para a justiça em Aracaju. 

O estudo Doing Business tradicional avaliava o resultado nacional, sendo que no último ranking o Brasil ocupava a 124ª posição entre 190 países. Isso dá conta do quanto a burocracia e o peso regulatório podem ser perniciosos para o ambiente de negócios e, portanto, prejudiciais ao desenvolvimento econômico e social. O documento com os resultados dos estados dá a dimensão do quanto se perde com a improdutividade burocrática: R$ 1,5 trilhão, conforme o próprio Governo Federal, em 2019. Ou seja, a máquina enferrujada que os empreendedores têm que carregar nas costas, consome 22% do Produto Interno Bruto brasileiro. É como se, a cada quatro motores fabricados, um fosse para a sucata; a cada quatro maçãs, uma apodrecesse no pé; a cada quatro noites reservadas de hotel, uma desse “no show” (não comparecimento do hóspede).  

Isso não faz a menor lógica. Os resultados, no limite, indicam que a burocracia balofa e amorfa se alimenta do esforço dos empresários em se manter regularizados e não do resultado do seu trabalho — impostos, taxas, consumo baseado na renda, no salário dos trabalhadores. O que explica, por exemplo, que abrir uma empresa em Mato Grosso custe dez vezes mais do que no Ceará? Como justificar que as empresas brasileiras consumam, em média, todos os anos, quase 1500 horas de trabalho não para pagar os impostos, taxas e tributos, mas sim para entendê-los e conseguir deixar tudo organizado? Neste quesito, por sinal, Santa Catarina não está nada bem: as empresas consomem 1800 horas/ano com o papelório, acima da média nacional. 

Em parte, o estudo do Banco Mundial dá contornos à situação daquele empreendedor que resiste bravamente, mas sucumbe à trágica mortalidade das empresas antes de completar cinco anos de existência. A “causa mortis” pode não ser apenas o ambiente desfavorável de negócios, mas ele certamente faz companhia a outros pecados originais, como a falta de preparo, de planejamento e de formação empreendedora. A regulação legal não o ajuda a se manter e é cruel na punição pelo fracasso.  

Governos, dos mais diversos matizes, depositam sobre as empresas e empregados o peso da baixa produtividade como a raiz de suas comorbidades. Esse diagnóstico é apenas parcialmente correto. 

Produtividade não é uma equação que considere só as empresas e os funcionários. Da “cerca para dentro” há, sim, deficiências de formação educacional e treinamento do trabalhador; assim como a baixa capacidade de investimento – também por falta de crédito abundante e fácil – do empreendedor o impede de crescer. Mas da cerca para fora, o ambiente inóspito e pouco amigável, como exemplificado pelo Banco Mundial, é uma barreira quase intransponível. 

A produtividade média do brasileiro já foi de 1/3 da do americano e hoje está em 1/5. Com esses resultados não dá para fazer aumento real de salário e criar massa salarial. Alie-se a isso os juros e os impostos altos, uma política fiscal deficiente e não há como ter um ambiente adubado para empreender. Resultado: temos poucas empresas per capita e baixa capacidade de crescimento e de geração de empregos. 

Criar um ambiente amistoso e amigável para a atração e a realização de negócios é uma questão de sobrevivência econômica. A posição de Santa Catarina no ranking geral dá bem a dimensão do tamanho do desafio e do quanto deve ser feito.