Nas últimas colunas temos percorrido a história mais recente de Santa Catarina – as últimas sete décadas – para buscar na saga dos colonizadores e depois, nos programas e ideias dos chamados ‘visionários catarinenses’, referências para um novo “plano de vida” catarinense, já que tenho a convicção de que é preciso renovar o sonho sonhado por aqueles que no passado começaram a construir um Estado hoje reconhecido no país e no mundo. Porém, antes de continuar por esse caminho ‘de volta para o futuro’ de SC, vou retroceder um pouco naquilo que escrevi nas colunas anteriores para fazer alguns ajustes de justiça e direito.

É que recebi do ex-deputado federal e amigo Paulinho Bornhausen algumas observações que dizem respeito à minha afirmação de que foi o governador Jorge Lacerda (1956/58) o autor do primeiro plano de metas para SC. Com um texto muito gentil, Paulinho diz que “sabendo da tua correção quanto aos fatos históricos, não poderia deixar de repassar informações e ajudar a recompor a história como ela é”. Neto de Irineu Bornhausen, que governou o estado de 1951 a 56, Paulinho recorre a uma das fontes à qual também tenho recorrido – os livros e estudos do eminente professor Alcides Goularti Filho – para afirmar que “o planejamento em SC começou no Governo do Seu Irineu”. E Paulinho acrescenta: “O Plano de Equipamentos e Obras de Irineu Bornhausen é o primeiro do Brasil, conforme esse trabalho de pesquisa. Quanto à energia, o mesmo criou a Celesc, numa visão clara do tamanho do desafio a época. Sem falar na criação da Secretaria da Agricultura e da Acaresc, que se tornaram Epagri e Cidasc mais tarde. Seu Irineu foi um visionário e realizador. No seu governo não houve estagnação. E sim obras e ações que foram copiadas por seus sucessores”.

Agradecendo ao Paulinho Bornhausen, quero registrar que fico extremamente recompensado por saber que o tema levantado pela coluna – a construção do sonho catarinense e o seu futuro – esteja sendo motivo para provocar a busca por nossa memória e também o debate sobre a formação socioeconômica de SC. Este também é um dos objetivos da minha pauta, até porque as novas gerações talvez imaginem uma Santa Catarina que “caiu do céu”, sem levar em conta que, se não tivermos nossa história como referência, dificilmente conseguiremos construir juntos um novo “plano de vida” para o mais belo estado do Brasil.

Feito o ajuste sobre o pioneirismo no planejamento promovido por Irineu Bornhausen, quero deixar patente que isso não macula as referências que fiz aqui com relação às ações visionárias do governador Jorge Lacerda, as quais, também por justiça, vou recordar agora. Lacerda criou a Sociedade Termelétrica de Capivari (Sotelca), no Sul – hoje, a Usina Jorge Lacerda que, privatizada, continua a ser a maior termelétrica da América Latina. Construiu 50 pontes e dez estradas estratégicas, entre elas a primeira rodovia estadual asfaltada, entre Blumenau e o porto de Itajaí – hoje Rodovia Jorge Lacerda. Reformou a Estada Dona Francisca, ligando a BR-101 a São Bento do Sul e priorizou a educação, lançando as bases da UFSC e da Faculdade de Engenharia de Joinville (FEJ). Lacerda construiu também 48 escolas e inaugurou o Instituto Estadual de Educação.

E assim, feitos os ajustes, podemos voltar ao ponto onde estávamos: o fim do período Jorge Lacerda/Heriberto Hülse, de 56 a janeiro de 1961, quando assume Celso Ramos, que inicia sua gestão com o famoso Plameg, o Plano de Metas do Governo. O Plameg (1961/65) impulsiona o crescimento, abre um novo sistema de crédito para o setor produtivo, faz investimentos em energia e transporte e a consolida o setor eletro-metal-mecânico, liderado por médias e grandes indústrias. De Norte a Sul e de Leste a Oeste do Estado criam-se as “marcas catarinenses”, que passam a ser reconhecidas em todo país e até no exterior. Pode-se dizer que é neste momento que o Estado sai do anonimato.

Planejar, então, passa a ser a palavra de ordem, depois do sucesso do POE e do Plameg. O sucessor de Celso Ramos, Ivo Silveira, cria o Plameg II (1966/70) e o sucessor deste, Colombo Salles, implanta o PCD, o Projeto Catarinense de Desenvolvimento (1971/75).

De acordo com o estudo “A formação econômica de Santa Catarina”, do professor Alcides Goularti Filho, os planos de desenvolvimento focaram quatro grandes áreas:

 

  1. Financeira – dotar o Estado de capacidade financeira para alavancar investimentos de longo prazo por meio de agências de fomento e programas de incentivo;

 

  1. Transporte – integrar as mesorregiões produtoras aos mercados nacional e estadual;

 

  1. Energia – ampliar a área de atuação da Celesc, gerando e distribuindo mais energia;

 

  1. Telecomunicações – aumentar a rede de telefonia e a oferta de linhas.

 

Nesse período também o Estado vê finalmente a BR-101 ser concluída, em 1971, interligando-se com o Norte e o Sul do país. Também foram asfaltadas as BRs 282 e 470, ligando São Miguel do Oeste, na fronteira com a Argentina, ao Porto de Itajaí. Os portos de São Francisco do Sul e Itajaí passam a ser melhor aparelhados – facilitando o acesso aos mercados internacionais. Nessa época em que os planos de metas davam o mapa do caminho a seguir rumo ao desenvolvimento social e econômico, destacaram-se alguns profissionais e gestores que construíram as bases de ideias para o Estado, como também foram precursores das instituições e empresas que Santa Catarina precisava para crescer. Entre outros, o professor José Artur Boiteux (fundação da UFSC), Glauco Olinger (agricultura), Aury Bodanese (cooperativismo), Celso Ramos (indústria), Colombo Salles (gestão pública) e o professor Alcides Abreu, um elo entre os integrantes desse grupo de “pensadores” de Santa Catarina.

Estávamos, então, no auge do ‘sonho catarinense’ – e esses sonhadores definiam e transformavam em realidade aquilo que queríamos ser um dia, ou seja, aquilo que somos hoje e, com certeza, muito além do que eles imaginaram. Com eles ainda aprenderemos muito nas futuras colunas desta série sobre ‘o novo sonho catarinense’.