Pacificação da aplicação de juros e correção monetária
O Brasil é um País que vive mergulhado em insegurança jurídica. Isso decorre da deficiência normativa provocada tanto pela excessiva produção de leis como pela omissão legislativa em temas importantes. Esse cenário de profunda insegurança jurídica afeta negativamente os negócios jurídicos. Por conta disso, há aumento dos custos de transação, fuga de investimentos e excessiva litigiosidade, o que não é nada positivo para imagem do Estado brasileiro pera a comunidade internacional.
Nos últimos meses, assistimos a um caso em que a insegurança jurídica contaminou negócios jurídicos, prejudicando a atividade econômica. A interpretação e aplicação do art. 406 do Código Civil gerou intensos debates nos Tribunais pátrios. A discussão era relativa à adequação da aplicação da taxa Selic ou de juros de mora de 1% ao mês acrescido de correção monetária por um índice oficial nas dívidas decorrentes de responsabilidade civil. A questão jurídica envolve as obrigações resultantes de responsabilidade extracontratual – mais conhecidas como perdas e danos – ou de responsabilidade contratual quando não houve taxa previamente convencionada pelas partes.
Sobre a temática, foram formados dois posicionamentos conflitantes no âmbito do Poder Judiciário sobre a aplicação de juros e correção monetária naqueles tipos de obrigações contratuais. Um deles sustentou que a taxa Selic não pode ser utilizada em substituição à correção monetária e aos juros de mora. Já o outro estabeleceu que a taxa Selic deve ser aplicada. A Corte Especial do STJ concluiu, por maioria (6 votos a 5), pela utilização da taxa Selic (REsp. 1795982/SP). Porém, o julgamento encontra-se aguardando a solução de questões de ordem suscitadas após a decisão plenária.
Para solucionar essa polêmica, que gera insegurança jurídica afetando o ambiente de negócios no País, foi aprovada a Lei Federal n. 14.905/2024, de iniciativa do Poder Executivo, publicada no Diário Oficial em 1º de julho, que altera o Código Civil, sob a justificativa de que a “fixação de regras mais claras sobre juros e atualização monetária reforça a segurança jurídica na contratação das mais diversas operações econômicas, evitando incertezas quanto a interpretações divergentes no âmbito do Poder Judiciário”.
A partir da nova Lei, nas hipóteses de descumprimento contratual, quando as partes não convencionarem o índice de atualização monetária e a taxa de juros a ser aplicada, ou nos casos envolvendo um dano extracontratual, funcionará da seguinte forma: a) a correção monetária será obtida mediante a variação do IPCA, apurado e divulgado pelo IBGE, ou índice que vier a substituí-lo; e, b) a taxa de juros corresponderá à Selic, deduzido o IPCA ou o que vier a substituí-lo, na ausência de previsão pelas partes ou por lei específica. Ou seja, será aplicada a Selic, mas descontado o valor de correção monetária do IPCA.
Nesse caso específico, a função legislativa funcionou adequadamente para a solução de grave insegurança jurídica causada pela divergência de interpretação e aplicação de normas legais pelos Tribunais pátrios. Esse é o papel fundamental do Poder Legislativo: produzir boas leis para regular de forma justa, eficiente e correta os diversos temas que afetam a vida, o patrimônio e a segurança das pessoas físicas e jurídicas. Melhorar cada vez mais o ambiente de negócios no País, mediante a construção de um ordenamento jurídico marcado pela estabilidade, confiança e previsibilidade, é um dever todos os atores envolvidos.
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