Entrevista – Júlio Garcia – Presidente da Assembleia Legislativa
Todos os sábados publicarei neste espaço, entrevistas com lideranças, políticos e empresários. É uma forma de trazer em uma conversa direta, o que essas pessoas pensam a respeito dos principais assuntos de interesse da população catarinense.
As entrevistas começam hoje, com Júlio Garcia, que pela terceira vez preside a Assembleia Legislativa. Um dos políticos mais habilidosos de Santa Catarina, volta a ter um mandato eletivo, após ter sido nomeado conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, onde também ocupou a presidência. Com um retorno triunfal, Garcia já no primeiro ano foi eleito por unanimidade para comandar o parlamento catarinense.
SC em Pauta – Como o senhor avalia o início dessa legislatura, já que a Assembleia Legislativa teve uma renovação superior a 40%. Como será essa experiência de mesclar a juventude com a experiência?
Júlio Garcia – Eu tenho percebido que a participação dos jovens, dos novos que chegaram a Assembleia é fundamental, muito embora, possa parecer que eles não tem experiência, mas eles trazem muita experiência. Alguns da convivência comunitária, outros de algum tipo de atividade e, essa mescla dos que convivem mais no parlamento com aqueles que estão chegando agora, tem ensejado um debate muito produtivo na Assembleia, que está mais vibrante e mais dinâmica. Eu tinha a certeza que isso aconteceria, a renovação aconteceu e eu tinha a certeza que ela seria boa para a Assembleia.
SC em Pauta – É muito natural que o ímpeto juvenil provoque uma certa pressa para resolver para ontem, os problemas do Estado. Como não inibir esse ímpeto, mas, ao mesmo tempo ter a segurança de que serão seguidos os ritos dos trabalhos?
Júlio Garcia – O regimento é cumprido em 100%. Não existe essa vontade de fazer mais rápido do que está previsto. A verdade é que todos querem prestar serviço para a sociedade, alguns com mais pressa, outros com mais cautela, mas na verdade o bom das decisões coletivas é que antes de acontecerem, elas são debatidas e são discutidas. A decisão coletiva sempre é melhor do que a decisão monocrática. Não existe esse problema na Assembleia, o regimento será cumprido em 100% e todos compreendem, não há dificuldade com isso.
SC em Pauta – Como o senhor avalia o fato de duas CPIs estarem começando praticamente junto com o ano legislativo?
Júlio Garcia – É uma demonstração de que a Assembleia está preocupada, está acompanhando o desenrolar das atividades e cumprindo com o seu papel. A Assembleia tem que legislar e fiscalizar e, no caso da CPI é fiscalização. Eu recebo com naturalidade e vou dar o seguimento regimental.
SC em Pauta – Qual é a sua opinião a respeito de cada uma das CPIs, no caso, a da Ponte Hercílio Luz e, a dos incentivos fiscais?
Júlio Garcia – O presidente não deve emitir opinião sobre a CPI, deve cumprir com o seu papel. O rito da CPI diz que colhidas as assinaturas, ela vai ao presidente e cabe a ele despachar para a procuradoria da Assembleia. Depois do parecer da procuradoria, sendo favorável e havendo a constatação do fato determinado, ela tem o seu tramite normal na forma do regimento. Nenhuma dificuldade, não vejo com preocupação.
SC em Pauta – Qual é o principal desafio da Assembleia neste primeiro ano?
Júlio Garcia – Eu acho que o principal desafio é compreender que estamos diante de um governo novo. Um governo que não tinha conhecimento do ambiente político, da máquina como um todo e que precisa de um período para adaptação. A Assembleia pode contribuir num cenário como esse, tendo essa compreensão e ajudando em tudo o que puder. A Assembleia não pode ser um poder estanque e alheio ao que acontece no governo de Santa Catarina, o nosso papel é exatamente o de contribuir. Quanto mais o governo precisa de ajuda, mais a Assembleia tem que atuar, esse é o nosso papel. Eu vejo nos deputados a disposição de ajudar, não vejo nenhuma dificuldade em ajudar a construir. Agora é preciso compreender que as coisas que forem boas para Santa Catarina serão aprovadas, o que a Assembleia entender que não é bom, serão rejeitadas e o que precisa ser modificado, assim será.
SC em Pauta – Há um peso maior pelo fato de ser um governo novo e inexperiente?
Júlio Garcia – Com o Luiz Henrique foi assim, com o Esperidião Amin foi assim, com o Raimundo Colombo e com o Eduardo Pinho Moreira também foi assim. O comportamento da Assembleia é esse. Só que eu acho, que o governo em função da inexperiência vai precisar um pouco mais da Assembleia e, nós não vamos negar o apoio nesse momento tão importante que passamos no Brasil e evidentemente em Santa Catarina.
SC em Pauta – Na questão dos decretos, como foi a iniciativa de se envolver, já que era visto que o governo não sabia que decisão tomar?
Júlio Garcia – Aí é que está a importância do papel da Assembleia, que através de seus 40 membros começou a ouvir a sociedade, os clamores do setor produtivo. Houve um momento em que nós ficamos preocupados e, diante dessa preocupação nos perguntamos o que fazer. Tivemos uma conversa com o secretário da Fazenda, explicamos para ele a situação e expusemos qual era a nossa ideia. A ideia era prorrogar o início da vigência dos decretos, permitindo que o governo tivesse tempo para se organizar e corrigir o que estava errado nos decretos, após um amplo debate com o setor produtivo e os seus seguimentos. Foi isso que ficou acordado e foi feito. Foi bom para todo mundo, o governo não foi derrotado e nem a Assembleia foi vitoriosa, quem ganhou foi Santa Catarina. É dentro daquilo que eu digo, o que for bom para o Estado, é o que vamos fazer. Essa é a forma de trabalhar que vamos adotar durante todo o mandato.
SC em Pauta – Nessa questão das isenções fiscais o Estado sofre o mesmo problema que vários outros, que entram numa guerra fiscal e por muitas vezes passam dos limites nos incentivos, mas, claro, não tirando a importância de se incentivar as empresas. O senhor acha que essa discussão tem que ser levada ao Governo Federal, que deve definir uma regra para todos, ou cada Estado terá que definir a sua situação?
Júlio Garcia – O modelo criado em Santa Catarina é apropriado. Essa questão somente se discute, pelo fato de existir a guerra fiscal que é maléfica para o país. Nós não temos segurança com a guerra fiscal, mas ela existe. Santa Catarina não pode sair sozinha da guerra fiscal, sob pena de perdermos o nosso parque produtivo para outros Estados que são agressivos. O Paraná é um Estado agressivo, São Paulo através do novo governador, também. Outro Estado é o Espirito Santo que é bastante agressivo nesse campo de incentivo fiscal e, atraiu muitas industrias para lá, tanto, que hoje é um Estado equilibrado, não tem déficit. Então não podemos sair sozinho da guerra fiscal, ela deve acabar em todo o país. Acaba fazendo uma reforma tributária, das reformas estruturais que eu defendo. Temos que ter um imposto só, a exemplo do IVA, como tem no Paraguai. Lá é só o IVA que é 10%, isso dá segurança, não essa nossa insegurança que é danosa, nós temos que disputar com outros países, não entre nós.
SC em Pauta – O que o senhor espera da reforma administrativa que será apresentada? O governo promete uma nova política desde a eleição, isso se traduzirá no projeto?
Júlio Garcia – Eu só posso me manifestar sobre a reforma após conhecê-la. Eu não quero falar sobre algo que eu não conheço. Na segunda-feira nós vamos conhecer o conteúdo da reforma e, aí sim, após ler e estudar, aí nós podemos avaliar. Depois vamos debater amplamente na Assembleia, vamos ouvir os seguimentos envolvidos e atingidos e, depois vamos tomar uma decisão. Eu não vejo nada de urgente na Assembleia que não se possa ter o tempo suficiente para discutir. Vamos cuidar da reforma com muita responsabilidade e no tempo adequado, nós vamos dar a resposta ao governo e à sociedade sobre o entendimento da Assembleia.
SC em Pauta – A questão das regionais já é ponto pacífico. Agora, tem as gerências regionais, a exemplo da Saúde e Educação que auxiliam na relação desses setores com as regiões. Como será a gestão desses setores para que cheguem os serviços aos municípios?
Júlio Garcia – Muito embora não se conhece o teor da reforma, mas já há uma grande preocupação com a situação das regionais da Saúde, devido a fusão, agrupamento, mudança de região, mas é o que se tem comentado. Nós vamos analisar e vamos ver, pois esse é um tópico que vamos olhar com muito carinho, por ser uma área muito sensível e temos que tomar cuidado com isso. Os deputados tem todas as condições de opinar e depois votar, pois, são eles que conhecem o que está acontecendo e onde está a necessidade.
SC em Pauta – O governador tem admitido a possibilidade de atraso de salários devido a dificuldade financeira. O senhor acha que o governo terá dificuldade para honrar os seus compromissos, além de não conseguir investir em infraestrutura?
Júlio Garcia – Pagar os salários em dia, o governo vai pagar, eu não tenho dúvida. A arrecadação cresceu, não tivemos sobressaltos nesse período, não existe um fato novo que possa ensejar o não pagamento de salários. Se o governo que estava até 31 de dezembro, pagou os salários e a arrecadação cresceu e, esse mesmo governo diz que está economizando, o que explica atrasar os salários, não tem explicação. Eu não sou alarmista e nem concordo com esse pessimismo, acho que vai pagar os salários em dia, agora, só pagar os salários não é atribuição do governo, ele precisa fazer mais. O governo precisa dar melhores serviços para a sociedade na área da saúde, educação e segurança, mas, também precisa ter recursos para investir em infraestrutura. Assim vai estimular o setor produtivo, aumentará a arrecadação, aumentarão os negócios e crescerá o número de empregos, esse é o papel do governo. Reformas no Brasil são fundamentais e em Santa Catarina nós temos que fazer a nossa parte trabalhando em três vertentes. Temos que trabalhar no aumento da arrecadação, estimulando a atividade, dando segurança jurídica para a atividade produtiva, além de trabalhar fortemente no alongamento da dívida para reduzir as parcelas e não contrair novos empréstimos de curto prazo e, reduzir o custeio. Reduzir a folha que é a maior despesa é um pouco mais difícil, o que é possível reduzir sempre é muito pouco, mas trabalhando as três frentes a médio prazo conseguiremos restabelecer as condições de fazer investimentos em Santa Catarina. É preciso definir o que vai se fazer com a conservação das estradas que faz parte da infraestrutura e, o que se sabe é que precisa de R$ 200 milhões para manter as estradas adequadamente e, o governo só dispõe de R$ 20 milhões, é muito pouco. Precisamos encontrar um mecanismo de financiamento dessa manutenção e encontrar dinheiro novo para investimentos, pois, precisamos de muito investimento na infraestrutura, tanto do Governo Federal, quanto do estadual.
SC em Pauta – O que muda no PSD com a saída de Gelson Merisio?
Júlio Garcia – A minha prioridade nesses dois próximos anos, é de cuidar da presidência da Assembleia Legislativa. Eu fui escolhido por unanimidade pelos deputados, então eu tenho a minha responsabilidade. Eu já comuniquei à bancada federal e à bancada estadual que não vou participar ativamente da atividade diretiva do partido. Se houver a mudança do comando do partido, evidentemente essa mudança tem que ser para oxigenar , para receber novas lideranças, para fazer uma gestão democrática dando liberdade aos diretórios municipais, para que eles possam decidir o seu caminho, pois, o município tem a sua particularidade, tem o seu desejo da coligação, aqui, ou acolá, enfim, estruturar o partido para a eleição municipal, essa eu entendo que deve ser a meta, que o comando estadual deve estabelecer a partir da mudança, se ela houver. Eu vou cumprir o meu papel de presidente da Assembleia e, ajudar os companheiros afinal de contas, sou do partido, sou partidário e vou ajudar, mas o meu foco é a presidência da Assembleia Legislativa.
SC em Pauta – O senhor é considerado uma das lideranças mais habilidosas politicamente em Santa Catarina. O senhor tem se reunido com Jorge Bornhausen entre outras lideranças. A ideia é levar o Napoleão Bernardes para o PSD para um projeto futuro?
Júlio Garcia – A direção partidária é que tem que decidir, quem trazer, quem convidar, quem receber e como receber. Eu sou amigo do Napoleão, converso com ele frequentemente, ele me consulta, eu acho que é um quadro valioso. Mas é muito cedo para estabelecer qualquer tipo de encaminhamento, mas é um quadro valioso entre outros que nós temos em Santa Catarina. Tem muita gente querendo trocar de partido, vai haver algumas migrações. Se houvesse a liberdade a migração não seria pequena neste momento, mas a direção é que vai cuidar disso.
SC em Pauta – É possível uma candidatura de Júlio Garcia em 2022 ao Governo do Estado?
Júlio Garcia – Não trabalho com essa hipótese. Eu quero participar de um projeto que seja bom para Santa Catarina. Um projeto que seja construído de baixo para cima, democraticamente com a participação de todos e a última coisa que deve acontecer, é a escolha do candidato. Eu quero estar junto no projeto. Vou ajudar como candidato, coordenador, subcoordenador ou voluntário.
SC em Pauta – Mas o senhor não descarta uma candidatura.
Júlio Garcia – Aparecerão nomes mais fortes, eu tenho compreensão para isso, não é o meu objetivo de vida. Tem pessoas que dizem que o objetivo de vida é ser governador e que vão tentar a todo custo, não é o meu caso. Eu não me vejo candidato a governador.
SC em Pauta – A situação política por que passa o país, pode atrapalhar o Estado?
Júlio Garcia – Eu acho que pode atrapalhar o país essa instabilidade, essa falta de harmonia entre os poderes a nível nacional. Nós estamos diante de uma necessidade premente de aprovar a reforma da previdência e, de tanta dificuldade, se retarda a reforma. Eu tenho muita preocupação, pois, não se aprovando a reforma o governo Bolsonaro terá problemas e, isso não será bom para o país. O bom é se aprovássemos a reforma da previdência, em seguida a tributária, aprimorássemos a trabalhista, fizéssemos a reforma política, enfim, fazer as reformas estruturais que o país precisa. Eu estou preocupado, sou otimista e acho que vamos sair dessa crise, mas a harmonia entre os poderes estando estremecida é preocupante. Tomara que a gente saia logo dessa crise para fazermos as reformas.
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