Ministério Público decide investigar nova licitação da Casan

Após representação apresentada pelo Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina (SINTAEMA), a 7ª Promotoria de Justiça da Comarca da Capital abriu uma notícia de fato para apurar as alegadas irregularidades apontadas pela entidade na licitação nº 236/2024, finalizada pela Casan em fevereiro deste ano.
Segundo a denúncia, o lote foi vencido pela SANEATEC Saneamento e Tecnologia Eireli com o valor R$ 17,499 milhões com homologação em março deste ano, valor abaixo do estimado pela estatal de saneamento de R$ 18,084 milhões, resultando em uma economia de aproximadamente R$ 584.607,66.
O problema, no entanto, seriam as “discrepâncias significativas” entre os valores ofertados pelos licitantes e também os preços de alguns itens ofertados pela vencedora, abaixo da cotação elaborada pela Casan.
Por esse motivos, foram apresentados questionamentos quanto à exequibilidade dos itens orçamentários e à regularidade do procedimento licitatório. Enquanto a empresa a segunda colocada ofertaram os valores de R$ 17,5 milhões e R$ 18 milhões, respectivamente, os valores das outras empresas licitantes ultrapassaram R$ 41 milhões, mais do que o dobro oferecido pela vencedora.

“Sugere também o sindicato a possibilidade de estratégias coordenadas como padrão de atuação das licitantes nos diversos procedimentos licitatórios realizados pela CASAN, pois após análise de outros certames com objeto similar no ano de 2025 (PL 179/2024 e PL 159/2024), desvendou-se que algumas dessas empresas participaram dos procedimentos simultaneamente, o que reforçaria a necessidade de olhar criterioso quanto à competitividade e isonomia das disputas. Dentre as irregularidades apontadas pela SINTAEMA, estão possíveis direcionamentos e favorecimento entre os licitantes, indícios de fraude na idoneidade da empresa vencedora e variações nos itens da planilha de orçamento. Deste último item, destaca o noticiante que foram identificados descontos expressivos em alguns itens da planilha de custos apresentada pela SANEATEC, o que pode indicar risco de inexecução do contrato, uma vez que valores muito abaixo da média estabelecida podem comprometer a capacidade da empresa vencedora de cumprir as exigências contratuais sem prejuízo à qualidade e ao cronograma das obras“, destaca o promotor Rafael de Moraes Lima no despacho que abriu a investigação.
Como mostrou o SCemPauta nesta semana, uma auditoria do Tribunal de Contas do Estado identificou cinco supostas irregularidades em obras de saneamento executadas na Capital.
De acordo com o relatório, o consórcio de empresas contratado pela Casan teria provocado sobrepreço por meio do chamado “jogo de planilhas”, prática que teria causado prejuízos superiores a R$ 3 milhões aos cofres públicos em um dos contratos.
A apuração do MPSC ainda está na fase inicial, a empresa vencedora e a estatal tem dez dias para responderem a um pedido de informações da promotoria. Mas diante das informações sobre desconto em planilhas nesta licitação, existe uma semelhança entre os dois casos em apuração pelos órgãos de controle.
Outro ponto levantado pela representação do sindicato é bloqueio na Justiça em 2021 de R$ 30 milhões da empresa SANEATEC, a vencedora da licitação na Casan e que agora será investigada. Trata-se de uma ação ajuizada em dezembro de 2017 pelo MPSC. O sindicato alega que após prestar serviços de abastecimento de água e coleta de esgoto em Palhoça entre os anos de 2008 e 2013, o Tribunal de Contas do Estado teria identificado que a empresa recebeu R$ 10,052 milhões por serviços de mão de obra não realizados.
O SCemPauta teve acesso a denúncia assinada em 6 de dezembro de 2017. A ação cita o valor apurado pela corte de contas e alegado pelo sindicato.
“Todos os contratos com a SANEATEC foram firmados durante os dois mandatos de RONÉRIO HEIDERSCHEIDT – Prefeito do Município de Palhoça de 1º de janeiro de 2005 até 31 de dezembro de 2012. A execução contratual, no entanto, estendeu-se até dezembro de 2013, alcançando as gestões de NIRDO ARTUR LUZ – Prefeito de 1º/1/2013 a 10/6/2013 – e de CAMILO NAZARENO PAGANI MARTINS – Prefeito a partir de 11/6/2013. No transcurso de todo esse período, mês a mês, a prática ilegal se renovava. Jamais, até o exaurimento da avença – em dezembro de 2013 –, a empresa teve sua atuação vigiada. Por isso mesmo, fraudava as medições e, por conseguinte, locupletou-se ilicitamente em detrimento da sociedade palhocense. Aqueles que mais deveriam zelar pela coisa pública se omitiram“, diz o documento assinado pelo promotor do caso, Augusto Zanelato Júnior.
Em um dos últimos despacho da ação de março de 2024, o juiz informa que o ex-prefeito Ronério Heiderscheidt ainda não tinha sido citado, sete anos depois, e pede que seja executado citando seu novo endereço em Foz do Iguaçu (PR).
Segundo o sindicato, a discrepância entre os valores apresentados pela empresa vencedora da licitação teria inclusive “alarmado a área técnica da CASAN, que solicitou esclarecimentos à empresa vencedora, exigindo a apresentação de documentos que comprovassem a viabilidade da execução dos serviços pelos preços propostos“. “E embora os itens questionados estivessem fora dos principais grupos de impacto financeiro do orçamento, a necessidade de justificativa demonstrou a preocupação com possíveis distorções na precificação”, diz o despacho da promotoria que vai investigar a licitação.
EXTRATO DE INSTAURAÇÃO DA NOTÍCIA DE FATO N. 01.2025.00018402-7
COMARCA: Capital
ÓRGÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO: 7ª Promotoria de Justiça
Partes: Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina (SINTAEMA), Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (CASAN) e Saneamento e Tecnologia (SANEATEC) Eireli.
Objeto: Notícia de Fato instaurada para apurar possíveis irregularidades ocorridas nos Procedimentos Licitatórios n. 159/2024, 179/2024 e 236/2024, realizados pela Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (CASAN). Suposto direcionamento e favorecimento entre licitantes. Denúncia afirmando a existência de indícios de irregularidade sobre a idoneidade da empresa vencedora e variações nos itens da planilha de orçamento.
Membro do Ministério Público: Rafael de Moraes Lima
Contraponto
Tentamos contato com a Saneatec, mas os telefones não completam a chamada. A Casan se manifestou por meio da seguinte nota:
“A CASAN informa que a Notícia de Fato instaurada pela 7ª Promotoria de Justiça da Comarca da Capital, foi decorrente de representação do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina (SINTAEMA), em relação aos Procedimentos Licitatórios nºs 159/2024, 179/2024 e 236/2024.
Os procedimentos licitatórios têm como objeto a terceirização de serviços operacionais, sendo a denúncia sobre aparente objeção da idoneidade de uma das empresas vencedoras do certame; bem como, na suposição de empresas estarem trabalhando de forma coordenada para tumultuar os processos e restringir a competividade dos procedimentos licitatórios.
O MP, como de praxe, abriu prazo para a CASAN se manifestar e juntar cópia dos procedimentos licitatórios mencionados, o que será providenciado e adequadamente respondido ao órgão, demonstrando a lisura praticada nos atos administrativos praticados pela Companhia.
Em uma primeira análise, não foram identificadas não conformidades técnicas, seguindo os procedimentos da Lei nº 13.303/2016 e o Regulamento de Licitações e Contratos da CASAN” – Assessoria de Comunicação da Casan
Procurados, o ex-prefeito de Palhoça, Ronério Heiderscheidt, disse não se lembrar de que a Saneatec tenha prestado serviços ao município. O deputado estadual e ex-prefeito Camilo Martins (Podemos) não atendeu à ligação. Também procurado, o vereador Nirdo Luz, o Pitanta, que foi prefeito interino, explicou que, na época, a Águas de Palhoça é quem fazia a gestão do abastecimento de água e saneamento. “Como era uma autarquia, automaticamente o prefeito está eximido de toda a responsabilidade. A responsabilidade civil e criminal é do presidente da empresa (autarquia)”, afirmou.
É importante informar que os ex-prefeitos foram procurados por terem sido citados no despacho do promotor, que menciona que a empresa Saneatec teve problemas no município de Palhoça. Porém, eles não têm qualquer ligação com as investigações envolvendo a Casan.
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