O outro lado da administração pública (IV)
No Japão, como é que é?
Em uma viagem particular que empreendi certa vez a Tóquio, comprei, no primeiro dia, uma linda máquina fotográfica Sony, pequena, mas de última geração, que eu havia prometido para uma de minhas filhas. E havia combinado com ela que aproveitaria a câmera nova para já ir tirando algumas fotografias, posto que, naquelas lonjuras do tempo, não havia telefone celular e, mais impensável ainda, algum que acoplasse artefato fotográfico. Saí, então, a pernear pelo centro de Tóquio, sacando fotos.
À certa altura, precisei fazer uma ligação telefônica e, para tanto, entrei numa estação de metrô onde havia cabines destinadas a esse propósito. Precisando consultar a lista de usuários que lá estava, depositei a maquininha numa pequena prateleira dentro da cabine. Consultei, anotei, fiz o telefonema, saí da estação, fui embora, deixando para trás, o presente da filhota.
Só fui me dar conta do esquecimento uns 20 minutos mais tarde. Pensei em voltar lá no metrô, porém, em um primeiro momento, o eco dos padrões de segurança do meu país me dizia que era besteira, perda de tempo. Naquela estação, enorme, já teriam passado milhares de pessoas, por certo, muitas delas tinham entrado na cabine e, provavelmente, uma delas, surpresa pela gentileza do turista distraído, levaria para sua própria filha a camerazinha tão charmosa.
Quase não voltei. Mas, algumas coisas que eu havia lido sobre o Japão me recomendaram que, pelo menos, tentasse descobrir algum departamento de “achados e perdidos” onde, um nipônico honesto e gentil teria entregado o objeto largado lá. Cheguei de volta à estação, já ainda mais movimentada, e por descargo de consciência, fui até a mesma cabine telefônica. Entrei e, quase não deu para acreditar: lá estava, na mesma prateleira, intocada, a câmera novinha em folha.
Outra vez Tóquio
Eu ainda estive uma segunda vez em Tóquio, desta vez a trabalho. Depois de alguns anos em Florianópolis, já instalado em Blumenau, trabalhando na Artex, telefonou-me o amigo Sergio Sachet que era secretário do Planejamento do Estado. Disse-me que organizações industriais japonesas haviam solicitado ao Governo a indicação de alguém ligado ao setor têxtil para viajar ao Japão a fim de fazer contatos e discutir parcerias com empresários daquele país. E Sachet perguntou se eu topava ser o indicado. Após consultar o então Presidente da empresa, Curt Zadrozny, dei o sim.
No dia em que desembarquei em Toquio, no final da manhã, tomei o cuidado, recomendável em caso de drásticas diferenças de fuso horário, de não cair na tentação de dormir no meio da tarde de lá, que corresponde à madrugada aqui. Quem comete esse erro, paga caro porque vai acordar durante a noite japonesa e, depois, não consegue se encaixar no horário local e fica sonolento e abobalhado por pelo menos uma semana.
Após chegar ao hotel, esvaziar malas, já quase anoitecendo, consultei alguém da recepção se eu poderia dar uma volta a pé pelas redondezas. Eu precisava matar tempo até chegar a hora em que os locais também iriam dormir. O japonês estranhou: “claro que sim”, respondeu, “porque não?” Expliquei que se tratava de uma questão de cuidado. Seria segura aquela área da cidade, de noite?
Dito isso, o rapaz entendeu que eu procedia de algum lugar bem diferente do Japão. E didaticamente explicou: “aqui em Tóquio você pode andar em qualquer lugar, em qualquer horário do dia ou da noite, sem receio; você está numa cidade segura”.
Próxima coluna:
Chibatadas em Cingapura e trombadinhas no Brasil.
Veja mais postagens desse autor