Quarta parte de uma série de artigos sobre este episódio da política catarinense. Os três primeiros estão disponíveis no site SC em Pauta

A definição do candidato a vice-prefeito

No início de 1988 ficou definido que Vilson Kleinubing seria mesmo o candidato de oposição para a Prefeitura de Blumenau. O grupo que o acompanha desde o início das tratativas tinha claro o fato de que sua candidatura contava com duas grandes vantagens. E sabia também que havia uma considerável ameaça. As duas primeiras eram seu talento para a condução da campanha e a forte ligação, política e afetiva, que ele já havia criado com a população da cidade durante a campanha para governador dois anos antes. No sentido oposto surgia como um possível obstáculo a condição de “forasteiro” que pessoas ligadas a outros possíveis candidatos já começavam a explorar. Quando, mais tarde, a campanha começou, o uso desse fator foi constante, especialmente por parte do ex-prefeito Renato Vianna que, à época, parecia ser o principal adversário de Kleinubing.

Devido a essa circunstância, a estratégia da campanha previa a escolha de um Vice “muito blumenauense”. Ou seja, alguém com raízes fortes no município, identificado com os valores de Blumenau, e exemplo de respeito e retidão. O nome que nos parecia reunir todas essas condições era o de Victor Fernando Sasse. Ele era figura de destaque na época, como professor e diretor do Colégio Pedro Segundo, dirigente da Celesc, e como líder da Comunidade Luterana de Blumenau. Correto, respeitado, nascido na cidade, já tinha sido candidato a Prefeito quatro vezes. Numa delas foi o mais votado individualmente, mas não ganhou porque havia na época um sistema chamado de “sublegendas”: cada partido podia lançar até três candidatos a Prefeito e o que decidia a eleição não era o número de votos de cada candidato, mas, sim, a soma da votação obtida pelo conjunto da legenda. Sasse foi o primeiro de todos os concorrentes, mas seu partido da época, o PDS, com sublegendas menos fortes, perdeu para o PMDB.

Sasse era o Vice ideal, mas havia um problema sério: ele já estava comprometido com outro postulante a prefeito, o empresário Pedro Cascaes Filho, do PL, bastante conhecido pela sua condição de líder em Blumenau das micro e pequenas empresas e de Presidente da Confederação Nacional desse segmento. Sasse estava disposto a ser o Vice de Cascaes.

Marcamos então uma conversa em Brasília com o Presidente Nacional do PL, o Deputado Álvaro Valle. O objetivo era conseguir dele uma espécie de intervenção amigável em Blumenau, convencendo Cascaes a liberar Sasse de seu compromisso. Depois de muitas xícaras de café no apartamento do Deputado, chegou-se a um entendimento. Álvaro faria todo o possível para demover Pedro Cascaes do propósito inicial, deixando Sasse livre para ser o candidato a Vice-Prefeito. Caberia a nós, de volta para casa, ajudar na tarefa do convencimento.

Assim foi feito. Victor Sasse foi o companheiro da chapa vencedora de Vilson. Após a posse ocupou também, de início, a Secretaria da Fazenda. E acabou, no ano seguinte, virando Prefeito da cidade.

Kleinubing e Sasse na Galeria dos Prefeitos de Blumenau.

Antecedentes das habilidades de Vilson

Quando começou o planejamento da campanha, em 1988, Kleinubing já tinha transferido sua família para Blumenau, matriculado os filhos na escola, e ocupava seu tempo com conversas políticas, com o programa de rádio que já fazia sucesso na cidade e com múltiplas visitas a pessoas, entidades, clubes de caça e tiro e em todos os lugares onde era chamado. Ele havia tido uma ótima experiência de campanha dois anos antes quando concorreu ao Governo do Estado. Naquela ocasião, aprendeu desembaraço, postura e intimidade com as câmeras. Teve como principal instrutora a jornalista e publicitária Laine Milan, da Salles Interamericana cuja equipe em Florianópolis era chefiada por Ricardo Mucci. Até então Kleinubing era tímido em um estúdio de gravação, falava de cabeça baixa, em voz baixa, quase encabulado. Porém, conforme relata Moacir Pereira no seu livro “Kleinubing, uma trajetória de coerência”, Laine durante uma gravação perdeu a paciência e gritou para ele: “Tesão Vilson, tesão!”. No susto, conforme também me foi relatado por uma testemunha do fato, o candidato pegou no tranco. Daí para diante deu-se a transformação do político discreto, retraído, em um craque da comunicação. Passou a falar sem teleprompter, com total desembaraço. E, nos palanques e auditórios, foi um dos pioneiros da técnica de conversar com a plateia, como se estivesse na sala de estar de cada pessoa da multidão.

Conta paga, sem condições nem pedidos

Conforme já mencionei no início dessa nossa novela, o projeto destinado a renovar a administração pública de Blumenau teve o incentivo constante de um forte grupo de empresários da cidade. Eles acompanharam as diversas fases da escolha de quem encabeçaria a chapa e, definido o nome de Vilson, reuniram-se com ele, no primeiro semestre de 1988. O tema da reunião era crucial: os recursos para a campanha.

A coordenação política da campanha havia mantido entendimentos com os diretores financeiros das empresas para a definição do orçamento. A eles foi apresentada uma proposta que, embora não fosse algum exagero, preenchia todas as necessidades de uma campanha ideal. Previa dinheiro suficiente para pagamento de um marqueteiro de boa qualidade, equipes de filmagem, pesquisas de campo quantitativas e qualitativas, enquetes por telefone, produção de músicas e jingles, comitê de campanha, enfim todo o necessário. Quando Vilson olhou os números finais, comentou que, se conseguíssemos uma parte daquilo, já estaria bom.

Na reunião, realizada na residência de um dos presidentes daquelas empresas, com a presença de todo o grupo dos possíveis patrocinadores, mais seus executivos financeiros, o grupo político e o candidato, foi apresentada e esmiuçada a previsão de recursos. A final, o anfitrião, após consultar com os olhos seus colegas empresários, perguntou se nós da equipe política entendíamos que aqueles eram os números necessários e suficientes para a campanha. Manifestada a resposta positiva, ele disse: “então o orçamento está aprovado”.

Mãos livres para governar

Foi passada então a palavra ao candidato Vilson Kleinubing que, em resumo, fez apenas um agradecimento e uma pergunta: “o que vocês esperam de mim?”. O decano do grupo então disse: “Para nós, não queremos e não vamos querer nada. Não dependemos da Prefeitura para coisa alguma. O que esperamos de você são três coisas: primeiro, que vença a eleição; segundo, que seja um excelente prefeito da nossa cidade”. Como ele fez uma pausa, Vilson indagou: “e o terceiro pedido?”. Então o empresário falou: “Na verdade é mais do que um pedido. É uma condição. A tua campanha não pode receber recursos de mais ninguém. Quando aparecerem os empreiteiros, loteadores, empresas de transportes e outros que dependem da Prefeitura, oferecendo sua ajuda, seja de que tipo for, diga não, nunca aceite. Para fazer a administração que nós esperamos, você tem de ter as mãos livres”.

Com recursos garantidos, foram ao pouco sendo acertados os entendimentos com as equipes profissionais e com os institutos de pesquisa

Pronto para a largada

E, afinal, chegou o dia. Foi iniciada a campanha. Ou, como talvez seja mais exato: começou o show, que só terminaria com a contagem dos votos e a extraordinária eleição de Vilson para o cargo de Prefeito de Blumenau.

É esse espetáculo que vou descrever no próximo capítulo.