O real avacalhado e o valor inestimável da viagem – Coluna do Paulo Gouvêa
Cheguei recentemente de Israel. Minha primeira forte impressão deve ser a mesma que milhares de outros brasileiros estão experimentando quando partem para algum lugar no exterior que não seja do padrão Argentina: os preços, para nós extravagantes, de hotéis, aluguel de carro, alimentação e passagens. É desanimador o custo de viajar que nos castiga em razão dos reais vexatoriamente enfraquecidos. Contudo, é fascinante a visita a esse estranho mundo novo construído pelos israelenses no encontro de três continentes Apesar da surra monetária, foi uma maravilha. Vale muito a pena. Vale até o preço.
A sensação de segurança
Não vou falar sobre o que todos já leram ou ouviram: a experiência cultural e religiosa, a transformação de solos inóspitos em oásis, a tensão permanente, em muitos lugares, devido à convivência forçada entre povos que não sentem qualquer simpatia um pelo outro. Quero, porém, fazer referência a um tema que está aí implícito. Se você estiver em Jerusalém, nas ruas Jaffa e Ben Yehuda, no final da tarde ou à noite, presenciará uma festa diuturna de celebração da vida. Essas vias transformadas em calçadões são ocupadas por bares e restaurantes sempre lotados. Há uma praça em que músicos amadores armam seus equipamentos de som e mandam ficha para quem quiser ouvir. No mesmo local alguém plantou um piano para qualquer um sentar e mostrar seu talento ainda desconhecido. E há nisso tudo uma paz alegre, um notável sentimento de confiança porque, em Israel, a segurança é levada muito a sério. Não há assaltos, roubos, arrastões. Deve, claro, existir o temor de um míssil lançado de longe. Mas, isso não tira o ar de felicidade, especialmente da garotada, porque, aparentemente, ela confia nos que cuidam da sua tranquilidade.
Eu vi, dentro do restaurante em que estávamos, um jovem soldado portar um fuzil quase maior do que ele. E ninguém por perto se abalou com a visão. O policial e o militar têm a confiança da população. Lá eles são prestigiados, excepcionalmente bem-preparados e bem pagos. Este é o meio certeiro para se obter eficiência.
Certo dia, dentro das muralhas da Cidade Velha de Jerusalém, testemunhei, em pleno dia e em meio a levas de turistas, um entrevero considerável entre israelenses (policiais ou soldados, não consegui distinguir) e um grupo de árabes. Estes provocavam seus históricos rivais com empurrões e um palavrório que visivelmente não era nada amistoso. Não consegui perceber a causa específica do arranca-rabo. É difícil distinguir ali quem poderia ser cem por cento mocinho ou bandido. O fato, porém, que me chamou a atenção foi o profissionalismo da turma da segurança. Embora fortemente armados, nem se coçaram. Também não entraram no bate-boca, não bateram em ninguém. Imobilizaram os mais exaltados, levaram dois ou três presos. E o bolo dispersou.
Na Holanda
Encontramos, lá pelas tantas, um casal de brasileiros que estivera há pouco em Amsterdam. Quando comentei que minha impressão dessa cidade era muito boa, eles disseram que, para eles, a cidade holandesa foi uma decepção porque estava muito suja. Isso me lembra que, de vez em quando, acontece greve de lixeiros em algum país europeu. Esta não é uma profissão fácil, tem certo grau de insalubridade e um forte e injusto desprestígio social. Por isso mesmo, em diversos países ricos, ela é muito bem remunerada. Eis aí outro exemplo de como buscar bons serviços públicos através da valorização dos profissionais que os prestam. E com muito mais razão quando o trabalho que eles fazem comporta algum tipo de risco. Sejam policiais ou lixeiros.
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