A sociedade brasileira vem acompanhado com perplexidade, nos últimos tempos, os crescentes casos de homicídios (tentados e consumados) e de lesões corporais contra advogados, cujas motivações se deram exclusiva e diretamente por conta das respectivas atuações profissionais.

Desse modo, tais fatos não devem ser compreendidos como “crimes simples” (aqueles em que, para o Direito, não há um motivo pontual) e, sim, como “crimes qualificados”, pois configuram verdadeiros golpes à Justiça em detrimento da motivação específica que, à vista disso, requer e não pode prescindir de novas elementares ao tipo penal; culminando na alteração das penas mínima e máxima, aumentando-as.

Afinal, não se está diante de violências perpetradas contra um indivíduo, tão somente. Aqui, a investida delitiva fere as atribuições exercidas pelos causídicos perante o Estado Democrático de Direito. Atacar esses atores que integram o arcabouço jurídico brasileiro – além de ameaçar à Advocacia –, denota uma horrenda afronta à democracia e à estabilidade constitucional brasileiras; motivação suficiente para incutir uma qualificadora à lei penal.

Qualificadora essa, aos moldes do que bem preconiza e resguarda a Lei N°13.142 de 6 de julho de 2015, que tornou mais severas as penas daqueles que atentarem contra a vida ou a higidez física de policiais, integrantes das Forças Armadas, Força Nacional (e, ainda, contra seus cônjuges, companheiros ou parentes consanguíneos até terceiro grau), em razão das suas funções.

Por conseguinte, um Projeto de Lei dessa envergadura – cujo fim amplie a responsabilização penal daqueles que atentem contra a vida ou a integridade física dos advogados, em razão das suas funções –, encontraria eco no art. 133 da Constituição Federal, que dispõe, justamente, ser o advogado indispensável à administração da justiça.

Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

Dessa forma, com a devida obediência às normas de individualização da pena, mormente quando se objetiva, inclusive, o enfrentamento ao crime organizado, se faz necessário imprimir maior responsabilização penal àqueles que cometerem homicídio ou lesão corporal contra advogados por conta do exercício da sua valorosa função ou em decorrência dela e, ainda, contra cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição.

Assim, espelhando as alterações esculpidas pela Lei n°13.142/15, enxerga-se a seguinte sugestão de redação em um eventual Projeto de Lei que modifique os arts. 121 e 129 do Código Penal e, também, do art. 1° da chamada Lei de Crimes Hediondos:

Art. 1º O §2 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar acrescido do seguinte inciso IX:

“Art.121………………………………………………………………………………………………………………………………………………………..

§2º……………………………………………………………………………………………………………………………………………………………….

IX –  contra advogados, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição:

………………………………………………………………” ..(NR)

Art. 2º O art. 129 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar acrescido do seguinte § 14:

“Art.129………………………………………………………………………………………………………………………………………………………..

§ 14º Se a lesão for praticada contra advogados, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição, a pena é aumentada de um a dois terços.” (NR)

Art. 3º O art. 1º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990 (Lei de Crimes Hediondos) , passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art.1º…………………………………………………………………………………………………………………………………………………………..

I – homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2º, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII, VIII e IX);

I-A – lesão corporal dolosa de natureza gravíssima (art. 129, § 2º) e lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3º), quando praticadas contra advogados, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição;

…………………………………………………………………” (NR)

Ademais, vilipendiar estes operadores da justiça, além de expor o desprezo que os criminosos têm para as instituições e para o sistema jurídico e constitucional do Brasil, fragiliza e coage a atuação funcional dos homens e mulheres que, diuturnamente, buscam defender a justiça e o Estado Democrático de Direito.

Notadamente, cita-se a trágica morte do advogado Celso Wanzo em São José do Rio Preto (SP), no último sábado (12/02/22). Apesar da grande imprensa ter noticiado que a morte se deu em decorrência de uma agressão motivada por uma discussão envolvendo um jogo de futebol, testemunhas relataram que o agressor – que é sindico do condomínio em que o advogado residia –, já nutria rusgas, animosidades e desprezo contra a figura profissional do advogado. Inclusive, há relatos de que, após ter desferido o soco que matou o causídico de 58 anos, o autor teria dito ao telefone que “eu acabei de acertar o ‘ex-advogadinho’ do condomínio que está aqui no chão caído”.

Em decorrência dos fatos, a Magistrada de plantão, Dra. Gláucia Véspoli dos Santos Ramos de Oliveira, decretou neste domingo (13/02/22), a prisão do homem que matou o advogado reverenciado por seus pares como pacificador e querido por todos.

Não obstante, vide o recente episódio ocorrido em Campos dos Goytacazes (RJ) no mês passado, onde uma advogada foi baleada por um cliente dentro do seu próprio escritório. O caso ganhou repercussão nacional e só não teve um desfecho fatal por conta da bravura da profissional que, mesmo ferida por projéteis de arma de fogo e lutando contra o seu algoz (que não aceitava a cobrança dos honorários advocatícios), conseguiu fugir e sobreviver ao atentado.

Por isso, incluir tais hipóteses qualificadoras ao regramento penal promoverá, ao menos, a concreta sinalização estatal no sentido de prover maior segurança funcional e tutela institucional aos importantes patronos que laboram perante a justiça brasileira. 

Thiago de Miranda Coutinho é Jornalista e Especialista em Inteligência Criminal. Atualmente, é Agente de Polícia Civil em Santa Catarina, graduando em Direito pela Univali, Coautor de três livros sobre Direito e autor de diversos artigos jurídicos reconhecidos nacionalmente. Instagram: @miranda.coutinho_