Entrevista: “Santa Catarina precisa pensar no turismo de proximidade” – Vinícius Lummertz
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Uma das maiores autoridades do país em turismo, Vinicius Lummertz, já passou por vários cargos de direção do turismo nacional. Foi secretário de Estado em Santa Catarina e atualmente ocupa esse cargo no Governo de São Paulo, além de já ter sido ministro do Turismo e ter presidido a Embratur. Ao SCemPauta, Lummertz falou da necessidade de se ter uma nova visão para o turismo catarinense.
SCemPauta – Como será a retomada do setor turístico após a pandemia do Coronavírus?
Lummertz – Em São Paulo nós estamos trabalhando a retomada da economia. No turismo, o que é importante que pode conectar São Paulo a Santa Catarina, é que na retomada será trabalhado o turismo de proximidade. A posição dos dois Estados é boa, nós já vínhamos fazendo um trabalho nessa direção no ano passado e com isso crescemos 5,4%, geramos 50 mil empregos, botamos 700 voos a mais por semana e ligamos os aeroportos do interior. Implantamos uma política de marketing, grandes campanhas que dizem respeito a São Paulo e ao emissor São Paulo. Essa valorização teve um impacto econômico muito forte, nós baixamos o imposto do querosene de aviação de 25% para 12%. Isso é parceria, as aéreas se comprometeram em colocar mais voos e investir em comunicação. Em tese, abrimos mão de uma quantidade de impostos, mas que retornaram através da atividade econômica. Fizemos uma série de programas e investimentos que vamos acelerar cada vez mais. Nós estamos mantendo os investimentos em turismo, por exemplo, falei com o prefeito de Brotas, onde têm seis obras nossa lá, para o turismo de natureza, o ecoturismo. Esse turismo vai se reforçar enquanto o turismo a distância vai encolher por questões de segurança, sanitárias e por deficiência de renda e pelo câmbio.
SCemPauta – Onde entra Santa Catarina nesse cenário?
Lummertz – O nosso turista de São Paulo vai para o nosso interior, mas também pode emitir as suas passagens e o seu turismo para Santa Catarina, pois é um estado que promete ter uma questão sanitária boa, ao contrário de outros que nem vou citar o nome. Santa Catarina tem o litoral, tem condição de se beneficiar do turismo que vem do interior, além do Rio Grande do Sul e Paraná, não depende como o Ceará, que depende do americano ou do europeu. Proximidade para o paulista é o interior do estado, mas também Santa Catarina que será o maior beneficiário.
SCemPauta – Como se preparar para receber esse turista?
Lummertz – Para buscar esse incremento para compensar outras perdas econômicas, precisará de uma política em Santa Catarina que passe por promoção, comunicação e a questão sanitária, questão de posicionamento quanto a questão sanitária que deve ser executada e comunicada. Viagem para a Serra, ou para as praias em qualquer época ganhará espaço mesmo fora do alto verão. Nós pensamos nisso aqui em São Paulo quando diminuímos as férias de julho para quinze dias, dividimos metade em abril e a outra em outubro, mas esse ano não deu para realizar. Também vejo como oportunidade o fato de Santa Catarina ter 18 parques naturais, mas nenhum é produto. Nos Estados Unidos se fala o tempo todo sobre os parques naturais, toda a hora na TV. Para quem assiste a CNN vê ali as discussões se os parques estão abrindo. Lá tem 320 milhões de visitantes em parques, enquanto o Brasil tem 12 milhões e, temos três vezes mais cobertura vegetal. Santa Catarina deve ter uma pauta diferente, como estou fazendo em São Paulo que é a promoção, pois é preciso promover. Também tem a pauta de investimentos e ambientes de negócio, então, eu mencionei parques naturais, mas isso nem é produto. Só em Florianópolis no mundo, tem uma sequência de parques que correm 100 quilômetros ao longo de uma capital que tem uma economia importante, mas isso não é percebido como tal.
Só em Florianópolis no mundo, tem uma sequência de parques que correm 100 quilômetros
SCemPauta – O que o senhor sugere como fomentadores desse turismo. Investidores privados?
Lummertz – Muito claramente o que estou te falando, é resultado da falta de política, de ênfase. Nas eleições para governador em Santa Catarina, ou mesmo para prefeito nos principais municípios, o turismo é muito pouco debatido, ele não orienta as prioridades do estado mesmo sendo 2,5% do PIB, eu mesmo medi isso. Não é relevante na política dos estados em geral. Em São Paulo nós mudamos isso, pois tem um governador que foi presidente da Embratur, um ex-ministro do Turismo, para você ter uma ideia estamos construindo um projeto chamado “Rotas Cênicas”. Projeto de seis rodovias que serão reformadas ou construídas, mas que passam a ter paradores, mirantes e uma série de produtos. Eu contratei para fazer isso, Luiz Henrique Gevaerd de Balneário Camboriú, aí de Santa Catarina. Técnico, é o que mais entende de rotas cênicas no Brasil. Também estamos discutindo a política de distritos turísticos, que é o que já tínhamos discutido para tornar o Beto Carreiro e Penha numa Orlando. Essas coisas não estão andando adequadamente. Eu lembro que tirei o imposto dos parques temáticos quando fui ministro. A gente abriu o capital das aéreas, mas há 20 anos não abrimos parque temático, sendo que o brasileiro é um dos maiores clientes do mundo de parques temáticos. Santa Catarina não pode depender de um herói como o Beto Carreiro, temos que ter política.
Eu contratei para fazer isso, Luiz Henrique Gevaerd de Balneário Camboriú, aí de Santa Catarina
SCemPauta – O senhor acha que é preciso um melhor aproveitamento do litoral?
Lummertz – Tem que ser prioridade dos governos, não só marina no mar, mas também lacustre e até de rio, pois nós temos 50% da produção de barcos de lazer do Brasil. Você vai no Boat Show no Rio de Janeiro ou em São Paulo, a metade dos barcos é de Santa Catarina e tem multinacionais também. É um setor que gera diversas atividades como materiais, pesquisa, motores e conserto de motores, além da indústria têxtil e áreas gastronômicas, o que valoriza a produção agropecuária do estado. É preciso entender o turismo. Quando o primeiro ministro da França diz que precisa recuperar a economia francesa, a primeira palavra que ele fala é turismo. No pós-Covid, tem que reestruturar essa visão e investir nisso, pois dá retorno rápido. Se você precisa de US$ 1 milhão de dólares para gerar emprego no setor automotivo, com US$ 22 mil dólares gera emprego num hotel de quatro ou cinco estrelas. Uma marina tem uma cadeia produtiva tão boa como uma BMW. Não quero dizer que a BMW não é importante, mas quero mostrar que os dois são, sendo que investir numa marina, é investir em algo que tem ligação direta com a cultura do litoral catarinense. Parques temáticos e marinas, essa economia natural de Santa Catarina que confere ao estado um sentido de denominação de origem, pois o vinho, a cerveja, tudo valerá mais. O turismo permite a pronta entrega, a venda na mão, o valor agregado, a oportunidade para a micro e pequena empresa, para a venda de artesanato, tudo isso estamos abrindo mão, ao não termos um programa peso pesado. Quais são os programas de turismo de Santa Catarina que não são peso leve? Que não dependam apenas do empresário? Não existe uma estratégia, mas o Covid obriga uma análise para que Santa Catarina possa viver do turismo de proximidade por um bom tempo, até chegar a um patamar que no futuro possa atrair pessoas de outros países.
SCemPauta – Essas ideias são para todos os públicos?
Lummertz – Tem que atrair investimos, marcas e bandeiras de qualidade, para todas as classes. Mesmo as classes de consumo mais baixo gostam de shopping, gosta de ter ar-condicionado, de ter ar nos ônibus, gosta de ter qualidade, então é preciso propiciar crédito para o setor, o governo precisa. Aqui em São Paulo quando cheguei, eu lancei um programa de crédito para o turismo. Num primeiro momento já houve demanda de R$ 350 milhões, agora estou buscando mais. O próprio BID que foram feitos vários em Santa Catarina, não foi feito nenhum Prodetur até hoje, que é o BID do turismo. Aqui em São Paulo estamos fazendo um. Estou alertando para uma mudança necessária, pois tem uma oportunidade firme, vamos embelezar cada vez mais as cidades e nos preparar. Estudo da Oxford Economic mostra que Santa Catarina é um dos lugares com a maior diversidade do mundo. Poucos lugares é como Santa Catarina. A Nova Zelândia é um exemplo, onde o cara está na neve esquiando na montanha e, olha para baixo e vê uma praia parecida com o Taiti. É um exemplo. Em Santa Catarina saímos do peixe frito para o chucrute em 45 quilômetros, nem a Europa tem isso. De um chopp produzido numa rota cervejeira, você muda para uma rota de vinícola na Serra em minutos via Rio do Sul, com todos os tipos de alimento, não falta nada na produção de Santa Catarina. Nós temos suíno, carne, queijo, eu desafio no Brasil quem tenha tudo como temos em Santa Catarina, a não ser São Paulo pelo tamanho. Embutidos diferenciados, isso tudo ficaria valorizado com outro modelo de turismo que não seja apenas de verão. Da forma como fazem sem planejamento, apenas esperando quantos vêm em cada ano, parece loteria.
Em Santa Catarina saímos do peixe frito para o chucrute em 45 quilômetros, nem a Europa tem isso
SCemPauta – O senhor acha que as pessoas sairão neste ano para fazer turismo?
Lummertz – Nós vamos entrar num novo normal. Em São Paulo nós temos cinco fases de flexibilização. Têm municípios na fase um, dois, três, mas nenhum na quarta ou na quinta fase ainda. Isso nós vamos atingir no meio do semestre que vem. O quanto disso vai sobrar no final como novos hábitos não sabemos. Mas a expectativa é que esteja na direção do que acontece na Europa que está começando a abrir. Eles estão dois meses a nossa frente e a expectativa é que caminhe nessa direção e, que tenhamos com alguma restrição a reabertura. Ninguém sabe como estará o cenário no fim do ano, mas temos que trabalhar na mesma linha da Europa e, a expectativa sim, é de que tenhamos uma boa temporada que será vital. O turismo influencia na arrecadação, pois todos os anos quando vemos o ICMS de janeiro a março e, também o ISS que tem um salto, ninguém fala sobre isso, há um silêncio sobre isso que não ajuda a construir uma política de turismo. A própria secretaria da fazenda se nega a valorizar. Poderia entender que o setor ajudou a melhorar a arrecadação e liberar mais recursos para investimentos no setor, que ajudará a aumentar a arrecadação novamente. Vários países compreendem isso. O Japão está pagando a metade do gasto de quem está indo fazer turismo lá, claro, é um país rico, mas veja o exemplo de que entendem a importância do turismo. A questão é: que atraso é esse que não entendemos o que representa um setor que gera 8,5% do PIB do país, 2,5% em Santa Catarina, 10% em São Paulo, mas que não merece um olhar mais inteligente? Aqui em São Paulo estamos investindo cerca de R$ 150 milhões para a criação de um setor de Inteligência em turismo. Você acredita que temos a inteligência de Santa Catarina aqui, do Parque Sapiens, trabalhando comigo lá em inovação e inteligência em turismo, além da criação de um parque temático de um jardim zoológico dentro do jardim botânico que está sendo privatizado. Então Lula, é uma nova forma de pensar.
SCemPauta – A burocracia em torno das licenças em Santa Catarina não trava o desenvolvimento turístico?
Lummertz – É preciso iniciar um diálogo em Santa Catarina, pois o ambiente burocrático é um dos mais inóspitos, assusta os investidores. Agora, a ocupação irregular não, vai lá no Farol de Santa Marta é uma tristeza aquilo da ocupação irregular, assim como nos morros, mas o potencial é absurdamente grande, mas de forma pragmática ele não é explorado. Precisa de discussão, de outra visão e agora nós temos oportunidade de olhar isso mais de perto e não estou fazendo discurso para Santa Catarina. Estou falando do que estou fazendo em São Paulo e que pode ser feito aí. A questão é que hoje em Santa Catarina não se discute nada. A verdade é que não há diálogo sobre o futuro em Santa Catarina, só se fala do presente ou do passado, mas para construir o futuro é preciso dialogar, de componentes e criar um sonho coletivo. O turismo não pode só depender da Secretaria de Turismo, é uma nova lógica que deve passar pelas diversidades e se aproveitar disso de uma forma positiva. A primeira questão que chama a atenção é que não há debate político em Santa Catarina. Onde está? É um povo maravilhoso, um estado maravilhoso que deu certo, será que não vão apresentar um projeto que anime as pessoas? O último que fez isso foi o governador Luiz Henrique, que animou as pessoas. Não é oba oba, é com especialista, não com consulta popular como fazia o PT. Precisamos de especialistas e já faz um tempo. Eu vi a lógica inspiradora do Luiz Henrique pelas artes, pela interiorização, pela internacionalização, pela tecnologia e para nos integrar com o mundo. Temos que profissionalizar.
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