Nos discursos políticos, é habitual que um candidato ou deputado mencione a frase “nós estamos do lado da Verdade”, ou “nós possuímos a verdade”. Sem poder ter acesso às intenções dos políticos nestes momentos, o que fica evidente ao proferirem uma frase como esta é a intolerância de não quererem que existam outras verdades contrárias as deles. Em seus discursos, parece que políticos se apropriam de certos termos como a “Verdade” em maiúsculas para afirmar a si mesmos (como uma espécie de ignorância) e para o público que possuem (no sentido de possessão) essa Verdade absoluta, e de que não há lugar para outros pontos de vista. Ele acaba violando a própria definição política, que é pública, e excluindo a participação de todos aqueles cidadãos ou agentes que divergem da sua ideia.

Na política democrática, o uso da palavra “verdade” deve ser tratada com responsabilidade, e não manipulada para fins ideológicos, eleitorais ou autoritários. Quem afirma frases como “estamos do lado da verdade, e quem discorda é mentiroso, traidor ou inimigo do povo”, acaba consolidando uma espécie de maniqueísmo político, anti-ético, que conduz a um perigo para a própria democracia, justamente porque promove sutilmente um autoritarismo discursivo. Em tempos de polarização, essa disputa acirrada pela “Verdade” se torna quase que uma obsessão.

Neste sentido, a filósofa Hannah Arendt distinguia entre a verdade factual (fatos objetivos) e a verdade política (opiniões ou afirmações sobre assuntos públicos). A verdade factual, como os eventos históricos, são fatos imutáveis e não se pode mudar. Em troca, a verdade política se constrói a través do diálogo e a discussão no espaço público.

Contudo, ela observou que os regimes totalitários (ou com tendências totalitárias) recorrentemente se apropriavam da verdade factual para distorcer a realidade e controlar a população de acordo com a sua própria concepção ideológica. Isto me lembra muito bem a imposição da verdade de um ex líder atual, que recentemente questionava sem nenhum fundamento as urnas eletrônicas, difundia sistemáticamente fake news para promover o uso da cloroquina durante a Pandemia, e divagava teorias conspiratórias que negavam fatos científicos concretos (IBGE, INPE, FIOCRUZ).