A Administração dos recursos humanos e das coisas públicas: o desafio da modernidade (IV).
Capítulo anterior.
Na semana passada abordei a ação do Governador Esperidião Amin nas cheias de 1983, trabalho este que, pouco tempo mais tarde, o elevaria à condição de celebridade nacional. E contei como foi que o Secretário de Administração teve algum papel no socorro que Santa Catarina recebeu do Governo Federal para combater os efeitos da enchente.
O grande salto rumo à notoriedade nacional.
A enchente de 1983 catapultou Esperidião Amin até os píncaros da celebração nacional. Era entrevistado pelos principais órgãos da imprensa nacional, era chamado para dar palestras do Oiapoque ao Chuí.
Sua conhecida carência de cabelos tornou-se marca registrada. Sua ação, desenvoltura e verve faziam grande sucesso. Houve uma passagem que, dir-se-ia hoje, “viralizou” Brasil a fora. Uma jovem jornalista, de longos cabelos, perguntou a ele sobre a importância da conservação das matas na prevenção de cheias. Ele pegou o copo de água que estava a seu lado e disse que, se derramasse o conteúdo daquele copo sobre a cabeça dela, a água desceria devagar e em pequena quantidade, porque seus cabelos reteriam grande parte do líquido; porém, se a água fosse entornada sobre a cabeça dele, desceria com rapidez e em abundância.
Amin começou a ser visto como um potencial candidato à Presidência da República, possibilidade esta, que ele não perdeu de vista.
Uma herança assombrosa. Problemas e boas surpresas.
Logo no comecinho do meu trabalho como Secretário da Administração, tive de encarar um problema politicamente delicado: diversos ocupantes de cargos em comissão da Secretaria não trabalhavam no local de suas funções. Um a um comecei a chamá-los para entender o que faziam, e onde. Havia duas alternativas: ou passavam a ocupar o posto previsto na sua nomeação, ou seriam demitidos.
O estranho caso do assessor que morava em Curitiba.
O evento mais bizarro foi o de um funcionário que, após várias mensagens minhas, sem sucesso, convocando-o para a conversa, enviou recado informando que não podia comparecer porque residia em Curitiba e estava ocupado lá com seus afazeres. Tive de dar um ultimato e, dias depois, afinal, ele apareceu. E foi bem franco: era proprietário de um posto de gasolina lá no Paraná e não tinha a menor possibilidade de cumprir seus compromissos em Florianópolis. Sua ligação com os catarinenses se resumia ao fato de que aqui residia um familiar seu bastante influente. E este aparentado tinha combinado com um político amigo, de Santa Catarina, que o dono do posto ocuparia aquele cargo, mas, ficaria lá nas araucárias.
Ele não quis me contar, e eu preferia não ouvir, quem era o político catarinense e nem os porquês de tal exótico entendimento. O que eu queria, consegui na hora: o beneficiário da facilitação assinou, prontamente, um pedido irrevogável de renúncia ao cargo que ocupava. Deve ter percebido que a moleza tinha chegado ao fim.
Funga-Funga, uma figura notável.
A conversa seguinte, eu temia que pudesse ser constrangedora. Àquela altura eu já tinha tratado com o Governador da demissão do paranaense. Não houve, claro, nenhuma dúvida na expressão de Amin. Já a situação seguinte era bastante mais sutil. Eu deveria ter uma conversa com o Sr. Antônio Antunes da Cruz, conhecido como “Funga-Funga”, um lendário cabo eleitoral, amigo do ex-Governador Dr. Aderbal Ramos da Silva, e objeto de admiração do Governador Esperidião.
Funga-Funga também tinha um cargo na Secretaria e, igualmente, não cumpria expediente no local. Tinha sido convidado para a função com tarefas a serem realizadas fora do âmbito do Edifício das Diretorias. Ele deveria ser uma espécie de representação do órgão lá no Ribeirão da Ilha, onde era conhecido por todos os moradores e sempre se dedicara a tarefas muito mais políticas que administrativas.
Quando falei ao Governador que teria de resolver essa questão, ele ressaltou o vínculo político e afetivo que tinha com o, agora, meu funcionário. E pediu que, se não tivesse como acomodá-lo dentro da Secretaria, que o tratamento fosse o mais respeitoso possível.
Uma conversa agradável e a previsão que não se realizou.
O diálogo acabou sendo bastante afável. Funga-Funga compreendeu que os novos tempos exigiam mais disciplina e ordem nos órgãos públicos, disse-me que não tinha como se dedicar a um trabalho diário, no Centro da Cidade, e que não ficaria magoado com a perda do cargo.
Nossa conversa foi de Amin até o “Doutor Aderbal” com que eu já havia estado, em duas ocasiões, no Clube Veleiros da Ilha. Funga-Funga contou histórias dos velhos tempos, divertiu-se com meu relato sobre o empresário curitibano, me falou da sua conhecida capacidade de prever os resultados eleitorais na sua área de atuação, urna por urna. E previu que Amin ainda chegaria à Presidência da República.
Esta foi, talvez, a única previsão sua que não se cumpriu por completo. Esperidião foi candidato a Presidente, mas, deu com os burros n’água. A predição do Senhor Antônio falhou. Afinal, dependia de um eleitorado bem mais amplo que o do Ribeirão da Ilha.
Próximo capítulo.
Na coluna seguinte vou relembrar meu entendimento com um personagem muito importante em Florianópolis: Roberto Biguaçu. E vou relatar os problemas com a fartura de licenças para tratamento de saúde, abundância de consultas e exames médicos, entre outros.
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