O surgimento da nova segunda via – Coluna do Paulo Gouvêa
De novo, mais uma vez, todo mundo trata da futura eleição presidencial do Brasil como sendo a batalha entre dois blocos. Basicamente, um confronto às avessas: entre os que são contra o PT e os que são contra os bolsonaristas. Tudo lá no lado escuro da força. Comentaristas profissionais e palpiteiros de boteco, todos olham em perspectiva para 2026 e enxergam a lógica das duas metades que vigoraram em 2018 e em 2022, a lógica da polarização.
Da última vez até que, se falou, por algum tempo, de uma possível terceira via. Depois, com a desistência, às vezes forçada, às vezes espontânea, de vários dos cogitados – Sergio Moro, João Dória, Eduardo Leite, Tasso Jereissatti, Luiz Henrique Mandetta, Luciano Huck, Alessandro Vieira, Rodrigo Pacheco – sobraram os que já eram os mais fortes e alguns coadjuvantes como Simone Tebet, Ciro Gomes e Soraya Thronicke.
Os analistas em geral culparam os partidos e seus líderes pela incapacidade de se entenderem e de concentrarem esforços a favor de um único candidato. De fato, houve vacilos. Mas, também houve um monte de erros de vários dos próprios pré-candidatos. E, mais do que isso tudo, paira a responsabilidade do eleitor brasileiro.
É inegável o fato de que nosso povo está viciado no consumo dessa duplicidade, dessa coisa futebolística – os meus aqui, os deles lá, e pronto, chega. O terceiro time atrapalha o raciocínio e talvez também a emoção do enfrentamento. Esse vício do eleitorado, o gosto pela briga simplificada, deste contra aquele, é, como todo o vício, difícil de sair do organismo. Acho que até a próxima eleição ele ainda vai perdurar.
É evidente que a expulsão de Jair Bolsonaro do centro dos conflitos, vai ajudar bastante a reunião de uma das segundas vias com a potencial terceira via. Algum outro possível candidato, como o hoje Governador de São Paulo Tarcísio Freitas, tem a privilegiada condição de ocupar o espaço de Bolsonaro, bem à direita, e, também, diferentemente do Capitão, de seduzir os eleitores mais ao centro – incluindo aí os que, de má vontade, votaram no segundo turno em Bolsonaro, só para tentar impedir a eleição de Lula. E os que votaram em branco ou anularam o voto.
Tarcísio não pode ser candidato
De acordo com a lógica político-eleitoral: Tarcísio não é candidato a Presidente. Ele é candidato à reeleição para o cargo de Governador do Estado. Digo isso, repetindo o que ele mesmo falou, porque tudo indica que tolo ele não é. Nenhum político importante, com chances de chegar à Presidência da República e no pleno uso de suas capacidades mentais, sai por aí proclamando que pretende disputar esse cargo. Não tanto tempo antes da eleição. Colocando-se voluntariamente no alto do palanque, ele vira o alvo bem visível de todos seus adversários, da imprensa (incluindo as redes sociais) e dos fofoqueiros em geral. Então ele não é candidato. Poderá, claro, vir a ser daqui a três anos. Mas, agora, não pode ser.
Seria um assombro se uma candidatura presidencial formalmente declarada sobrevivesse a três anos e meio de pancadaria e maledicência. Só quem não pode evitar essa situação de tiro-ao-alvo de parque é aquele cidadão que já é Presidente, que já está no cargo, e que, todos sabem, só não será candidato se estiver totalmente incapacitado – fisicamente ou juridicamente – de assumir a candidatura.
Tarcísio e os demais pretendentes a ocupar uma das duas vias predominantes, aquela que ficou desocupada com a inelegibilidade de Bolsonaro, têm em mente, por certo, esperar que o candidato do outro lado, exposto à chuva, aos raios e trovões da opinião pública, pegue um resfriado pelo caminho.