Ex-governador tem sido um dos principais incentivadores da esposa — Imagem: Arquivo pessoal

No instante em que um médico pronuncia a palavra “câncer”, o mundo parece encolher. O ar pesa, os sons se distanciam, o futuro se apaga por segundos. Foi assim comigo. Receber o diagnóstico de CA foi como ouvir um trovão em céu limpo: insegurança, medo, desconforto… e, sobretudo, tristeza. Por alguns dias, acreditei estar me despedindo da vida. E, no entanto, nessa montanha-russa de emoções, descobri algo precioso: o quanto eu amo estar viva. O quanto eu desejo viver. E decidi — sim, decidi — que faria tudo o que estivesse ao meu alcance: confiar na medicina e, acima de tudo, confiar em Deus.

O câncer ainda carrega um fardo de tabu e preconceito. Falta informação. Sobra medo. Para muitos, é sinônimo de morte, sofrimento, culpa. Mas todos os dias, silenciosamente, milhares de mulheres recebem esse diagnóstico — e lutam. Nas redes sociais, o retorno tem sido um bálsamo. Depoimentos de cura, histórias de superação, receitas, modelos de amarração de lenços, terapias complementares… um universo de partilha que me alimenta. Esse carinho é combustível para o caminho da cura. E, se eu puder ser um exemplo de que se pode atravessar o vale com mais leveza, já terá valido a pena.

Quando se tem um bom médico, uma família amorosa, amigos encorajando e muita fé, a vontade de viver vence a tristeza. O diagnóstico inicial me permitiu fazer cirurgia rápida e iniciar o tratamento logo em seguida. E essa esperança é âncora. Ela sustenta nos desconfortos da quimioterapia, na vigilância constante que passa a fazer parte da rotina, nas mudanças do corpo.

Os cabelos de uma mulher falam sobre ela. São história, identidade, cultura. E é por isso que a queda dos fios pesa tanto. Quando o meu cabelo começou a cair, não nego, doeu. Mas preferi olhar o que havia de positivo: o medicamento estava agindo, destruindo as células doentes. A queda era um sinal — duro, mas claro — de que eu estava a caminho da cura.

Aceitar, às vezes, é também um ato de força. Decidi, então, cortar aos poucos. Fui diminuindo o comprimento até passar a máquina, sem constrangimento. Foi libertador. Descobri meu rosto de outro jeito, meu corpo de outra forma. Careca, me vi inteira. E gostei. Tanto que vou adotar o cabelo curto por muito tempo.

No dia de raspar os cabelos, meu marido, Moisés, estava ao meu lado. Parceiro em todas as decisões importantes, ele fez daquele momento algo natural, quase ritualístico. Durante a primeira etapa, só ele sabia do que eu estava vivendo. Só depois dos resultados de todos os exames compartilhei com minha família e amigos, pedindo orações. Pedi que meu corpo permanecesse forte, minha mente equilibrada, minha fé inabalável. E assim tenho me mantido, pela graça de Deus.

Hoje, meu desejo é simples: que minhas “amigas do peito” continuem acreditando na cura. Que façamos juntas tudo o que está ao nosso alcance — fortalecer a fé, cultivar amizades, experimentar novas rotinas, incluir atividade física mesmo durante o tratamento. Porque viver, mesmo no meio da tempestade, é ainda viver.

Dia 8 de outubro fiz minha última sessão de quimioterapia. Depois virão mais 14 aplicações de trastuzumab, a cada 21 dias. Depois, médicos avaliarão radioterapia e bloqueio hormonal. Mas eu aprendi uma lição que vale para qualquer fase: viver um dia de cada vez.

Outubro Rosa é um convite. Um convite à prevenção. Um convite à informação. Um convite à vida. Porque, sim, há dor. Mas há também esperança, coragem e renascimento. Que esta campanha não seja apenas um laço no peito, mas um chamado ao autocuidado.

Késia Martins da Silva – Professora aposentada e ex-primeira-dama de Santa Catarina