Obras irregulares: sapatos menores que os pés.

Conforme vimos na coluna anterior, um dos casos mais frequentes de infração das regras urbanas na Blumenau pré-1989 foi a aprovação de construções maiores do que permitia seu terreno. Conforme as regras vigentes à época, a área construída de qualquer prédio deveria ter uma determinada proporção com o tamanho do lote onde se situaria. Em várias situações, entretanto, o tamanho do chão era inferior ao exigido pelo porte da construção.
Por aí começou nossa averiguação de como se poderia transformar uma barafunda ilegal em uma nova situação devidamente enquadrada na moldura da lei.

A descoberta que inspirou as regras da regularização.

A primeira prescrição foi fruto do mais elementar bom senso e também de duas jornadas de observação que fiz presencialmente.
Tendo em mente a característica básica daquele tipo de irregularidades, uma ideia naturalmente já habitava minha cabeça: a possibilidade de ampliação dos lotes, a eventual agregação de um pedaço a mais de terreno ao lote original, de modo a completar a exigência legal para o tamanho da obra.
Saí, então, da Prefeitura a pé, fui até o outro lado do rio para ver de perto um dos casos mais comentados pela imprensa e que mais dor de cabeça nos dava: a construção quase concluída de um hotel que se podia ver a olho nu da janela do Gabinete do Prefeito.
Quando o sapato é menor que o pé, o jeito é aumentar o tamanho do calçado.
O dono do hotel, cujas obras nós havíamos embargado, chorava pitangas quase diariamente, pedindo aquiescência nossa para a conclusão de seu empreendimento. O porte do prédio, todavia, ultrapassava a quantidade de área construída prevista na lei para o térreo em que se situava. O pé superava o tamanho do calçado.

Então fui lá e constatei uma circunstância auspiciosa: exatamente ao lado do hotel, contíguo a ele, havia terreno vago, não edificado. Para fazer um teste, chamei o proprietário do hotel à Secretaria e lhe informei que talvez houvesse uma solução para seu problema: ele deveria incorporar o tal terreno vizinho ao projeto original do prédio. Com o aumento da base térrea, era provável que as consequentes novas
proporções da obra resolvessem o problema.
Ele argumentou que o referido terreno não era dele, que o dono, sabendo do perrengue em que ele estava metido, de certo pediria um preço alto. Eu respondi que esse, muito provavelmente, seria o preço que ele teria de pagar para acabar com seu drama. De acréscimo, disse eu, teria um espaço a mais para estacionamento ou uma área de lazer.
E, por outro lado, ele devia levar em conta que a alternativa seria a penalidade aventada pelo Ministério Público: demolir o excesso de construção.

Próxima coluna.
As regras para regularização de edificações em situação irregular.
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