Solidão e distanciamento, um mal do século XXI?
John Berger, um dos críticos de arte mais importantes do século XX, faz um chamamento geral na sua obra “TheShape of a Pockett” (atualmente sem tradução para o português), alertando sobre os tempos nos quais o homem contemporâneo desembocou: tempos de solidão, mais agora do que em outras épocas. Comenta sobre esse mundo de aparências no qual vivemos atualmente. Acostumados a viver em uma certa ordem regular no dia a dia, acreditamos perceber o mundo e as circunstâncias de um modo uniforme e regular. Mas, como bem dizem a maioria dos filósofos, as aparências enganam. E, quando menos se espera, algum acontecimento ou circunstância rompe com essa ordem regular do dia a dia. Mas o que tem a ver essa ruptura com o sentimento de solidão que o autor enfatiza?
Para explicar o diagnóstico da solidão atenuante do século XXI, John Berger recorre ao termo “distanciamento”. A solidão é produzida por um certo “distanciamento”. Mas distanciamento em relação a que exatamente? O autor explica que vivemos no mundo das aparências, de coisas superficiais, que nada têm a ver com coisas reais e verdadeiras. Ele denuncia essa era repleta de virtualidades (abundância de imagens), que distanciam o ser humano do que é real. Além disso, a nossa realidade visual, quer dizer, tudo aquilo que observamos no nosso dia a dia, está condenada a uma constante e frenética transformação. Basicamente, não há tempo para assimilar a realidade na qual vivemos. Não sabemos se amanhã a realidade será a mesma.
Uma situação contrária a esse “mundo das aparências” e a essa “realidade mutante” na qual vivemos atualmente, e que é própria das urbes e metrópoles, seria, por exemplo, viver em uma fazenda. Nela observaríamos provavelmente as mesmas coisas todos os dias. Nos habituaríamos a ver as mesmas imagens do nosso entorno, o campo, as vacas, as cores. Esse hábito de observar sempre os mesmos objetos nos aproximaria do nosso entorno, e paralelamente nos faria sentir familiarizados e próximos, e também pertencentes a um mesmo lugar. Mas, contrariamente, no nosso mundo atual, familiarizar-se é uma das carências do nosso século, ou ao menos uma carência básica das grandes metrópoles, que transformam e modificam a realidade do nosso entorno a cada dia, e que nos distancia inclusive daqueles objetos que parecem estar próximos a nós, na nossa frente, quando em essência estão distanciados. Nas redes sociais (Instagram, Facebook), por mais “próximas” que estejam as imagens diante dos nossos olhos, tais produzem “distanciamento”, e acentuam a solidão. Somado a isto, a dinâmica das metrópoles conecta o indivíduo com coisas “irreais”.
O mundo atual progride a uma velocidade vertiginosa, e o indivíduo muitas vezes se sente obrigado a seguir esse ritmo incontrolável. Reside em nós, e sobretudo nos jovens e adultos, a necessidade de estar constantemente atualizados. Para cumprir com este mandamento autoritário, acabamos nos submergindo em uma voragem de imagens inconexas, as quais nos provocam o que o autor indaga por “distanciamento” da própria realidade, produzindo maior solidão. A solução para este “distanciamento” e para este diagnóstico de “solidão” atual atenuada é justamente a de ir em busca da “proximidade”, que reside nas coisas mais simples e reais. Cabe a cada um de nós aplicar este antídoto para promover um maior bem-estar individual.
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