As manifestações do público bolsonarista na frente dos quarteis têm dois aspectos antagônicos. O primeiro, do qual acho que ninguém deva reclamar, é a atitude em si, ou seja, os desgostosos querem exibir sua tristeza e até certo ponto sua inconformidade, com o resultado da eleição. Praticamente metade do País votou em Bolsonaro e uma parte dessa multidão acredita que existe um relatório das Forças Armadas demonstrando que teria havido fraude em prejuízo do atual Presidente. Eu não acredito nisso, mas não tenho o direito de me contrapor aos que acreditam. Embora muita gente diga que não cabe chorar em público, que isso deveria ser feito no escurinho do quarto de cada um, entendo que a forma de mostrar seu lamento cada um escolhe a que lhe agrada mais, desde que não contrarie e a lei e não azucrine a vida dos demais cidadãos. Expressar seus sentimentos e crenças, mesmo em vias públicas, é direito garantido pela Constituição.

Mas, há o segundo aspecto

as manifestações estão sendo feitas no lugar errado. Nas rodovias, nem se fala. O próprio Bolsonaro já condenou essa bagunça. Mas, também não é adequado manifestar-se em frente aos quarteis. Os militares não têm nada a ver com tudo isso. E nem querem ter. Desde que apearam do poder em 1985 eles resolveram nunca mais se meter no que não lhes diga expressamente respeito. E isso inclui possíveis interpretações mais amplas das incumbências previstas no artigo 142 da Constituição. O que a tropa pensa é isto: eles que são civis que se entendam. Então parece mais adequado que essas manifestações sejam feitas em frente aos juizados eleitorais de cada município, junto aos TREs e ao TSE. Se houve erro, falha ou sacanagem nas urnas eleitorais, quem deve tomar providências é a Justiça Eleitoral. Ah, mas se esses estão de conluio com a fraude, como é que vão corrigir o erro e dar a vitória ao derrotado? É, também acho praticamente impossível. Mas, o fato é que Jair Bolsonaro, ele mesmo, aceitou o resultado quando agradeceu os “58 milhões de votos” recebidos. Depois disso o Presidente foi até o STF e lá teve uma conversa amena, sem reclamações, civilizada e convergente com seus membros, incluindo aí o Presidente do TSE, Alexandre Morais. Ou seja: não vai haver providência alguma para alterar o resultado da eleição.

Sem artigo 142, bola para frente

Também não será ativada a cláusula do artigo 142 da Constituição que autoriza as Forças Armadas a garantir “a lei e a ordem”. Esta norma, na verdade, só se aplica em caso de revolução, guerra civil, caos generalizado. E teria que ser solicitada por um dos três poderes da República. Se o Executivo não vai pedir, muito menos, certamente, o Congresso ou o Supremo. Mas, tudo isso, por certo, não impede que cada um dos milhões de inconformados expresse seu desencanto da maneira que achar melhor e que a lei considere aceitável. E, enfim, há que se agir como aconselhou o Senador Flávio Bolsonaro: “levantar a cabeça e não desistir do Brasil”. Eu acrescento: nem na política, nem no futebol.  

Fica bem Mourão passar a faixa?

Dizem que Bolsonaro não vai passar a faixa presidencial. E daí? Os comentários de que Bolsonaro cometeu uma descortesia, quase uma grosseria, não telefonando para seu adversário após a eleição, é pura conversa fiada de parte da imprensa. Vamos lembrar: na eleição anterior, quando ele foi o vencedor, o outro concorrente telefonou para ele? Não senhor. Fernando Haddad não fez isso. Só passou um WhatsApp protocolar. E entendo, por outro lado, que Bolsonaro também não deve pagar o mico de se encontrar com Lula e passar-lhe a faixa presidencial. Depois do que eles se xingaram um ao outro nas propagandas da campanha e ao vivo, cara a cara, nos debates, não há como fazer de conta que são pessoas educadas, que devem conviver harmonicamente. São gato e rato e assim provavelmente continuarão sendo. Entendo que a prevista ausência do atual presidente devido a uma especulada viagem para fora do País, no dia da posse, é uma boa ideia. Deixa o Mourão transferir o cargo. 

O valor do silêncio

Por último: favor acalmar os ânimos. Nenhuma desavença política vale uma amizade, um laço familiar. A briga entre os políticos até pode se estender por mais quatro anos. Isso faz parte do jogo. Agora, gente da mesma família ou unida pelo vínculo da amizade que andaram se estranhando na eleição, esses, todos, devem imediatamente estabelecer um pacto de não-agressão. E isso começa com o conselho que ouvi muitas vezes de meu falecido sogro, “o silêncio vale ouro”.